CHICÃO & JOCA DE OLIVEIRA – FRENTE A FRENTE
Postado por DCP em 28/11/2021
Apresentação e seleção dos poemas por
Valmir Jordão¹
Chicão e Joca de Oliveira, dois poetas representantes da Geração 80 e partícipes do Movimento dos
Escritores Independentes de Pernambuco.
Chicão no
início dos anos 80 no Beco da Fome, na rua Sete de Setembro, no Casarão 7,
no Savoy, Calabouço e nos eventos da Livro 7 com Fátima Ferreira e
Eduardo Martins, Raimundo de Moraes, Jorge Lopes Samuca Santos, Luiz
Carlos Monteiro, Dione Barreto, Celso Mesquita e outros.
O Joca de
Oliveira é do segundo momento nos eventos da Casa dos Estudantes de Engenharia
na rua do Riachuelo e na Casa dos Estudantes do Derby, além da rua do
Hospício em frente ao Teatro do Parque no Bar do Joaquim, Maremoto, Viena,
Caldinho do Henrique com Erickson Luna, Chico Espinhara, Humberto Felipe, Fred Caminha,
Eunápio Mário, Heloísa Bandeira, Wilson Vieira, Teixeira, etc.
Frente a frente, dois
poetas da mesma geração e dicções diferentes, mas, dois grandes amigos e
pariceiros na poesia e boemia das imperdíveis noites recifenses.
Francisco de Paula Machado, Chicão, poeta, nasceu no
Rio de Janeiro em 1960.
No final
dos anos 70, conviveu com os poetas do Movimento dos Escritores Independentes -
MEI-PE tem poemas publicados na Agenda Cultural do Recife, no Jornal do
Commércio, Diário de Pernambuco, Balaio de Gato, Poesia & Cia, De Cara com
a Poesia, O Garra.
Participou
dos Documentários: Poemagem de Mateus
Sá, No País do Racismo Institucional
do GT Racismo - MPPE.
Com
participação na Bienal Internacional do Livro de Pernambuco, na Exposição de
Fotografias na Casa do Patrimônio - Olinda, no Programa Radiofônico Momento
Cultural na Folha de Pernambuco com Saulo Gomes, na IV Literária do Centro Luiz
Freire - Olinda, na Exposição 50 Anos de Memória de Carlos Pena Filho -
Santander Cultural. Também no filme: É Lá
Que Eu Vejo de Mateus Sá com os poetas Malungo, Miró e Fernando Chile.
Geração 80
de Cida Pedrosa, Véspera com Jomard Muniz de Brito, e no inédito Cabeça de Todos com a poetisa Fátima
Ferreira. E tem poemas publicados na Argentina, através do poeta Héctor
Pellizzi.
Joca de Oliveira é
natural de Ribeirão/PE. Nasceu em 1956. Seu primeiro contato com a poesia foi
na feira de Ribeirão olhando os cordelistas e suas violas. O seu pai comprava
aquela literatura pra ele. Depois, na adolescência, viu poemas livres de um
vizinho, Antônio Olívio Ramos, e apesar das poucas rimas e de um trabalho menos
melodioso, sua poesia trazia a mesma magia do cordel. Encantava-se também.
Estudou Direito
em Recife já adulto. Conviveu no seio da poesia alternativa, lendo os fanzines
de Zizo, de Wilson Vieira, Xico Sá e outros, no começo da década de 80.
Joca sempre
desejou, porém, alcançar uma formação acadêmica na área da Literatura. Estudar
versificação e sua métrica, conhecer as formas tradicionais da poesia. Não
conseguiu. Teve que sobreviver fora da
poesia e findou num curso de Direito: “Hoje
me perdoo por essa minha fraqueza”.
Porém, foi
na Casa de Estudante Universitário da UFPE que manteve contato com o pessoal de
Letras e com a poesia de alunos de outros cursos. Participou, nessa época, dos
muitos fanzines que rolavam dentro do Campus. Tirei meus poemas da gaveta.
Mais tarde,
já na década de 90, encontrou com poetas do Movimento ÃO Últimos Pássaros da Cidade.
Hoje, tem mais
um livro de poemas livres e dois de haicais. Depois dos agitados tempos dos
recitais, continua alternativo de bancada, e, atualmente, se preparando para
lançar o próximo livro: “Eu digo que a
minha formação poética é uma colcha de retalhos, retirada da leitura dos
consagrados e dos meus amigos alternativos...”
CHICÃO & JOCA DE
OLIVEIRA – FRENTE A FRENTE NO DCP
Canto pra Nanã
Chicão
Depois do verbo
Antes dos mangues
Nanã já era limbo
Saber profundo
Entrada e saída deste mundo
Senhora do tempo
Das almas esquecidas
Dos corpos doentes
Cobertos de chagas
Vovó dos pântanos
E terras movediças
De noite lume, de dia rosa
A mais velha flor do charco.
O pescador
Joca
de Oliveira
A primeira, nenhum
peixe alcança.
Paciente, como um
relógio,
O pescador, outra
vez, lança
Sua valiosa rede ao
mar.
Sem Jesus ao lado de
Pedro,
Contra o mar e seus
segredos.
A solidão do mar e o
pescador,
Os dois parecem
competir:
Um, para preservar; o
outro, para extrair.
O pescador segue
firme, pronto, paciente,
E, mais uma vez,
lança a rede sobre o poente.
Vozes alagadas
Chicão
O tempo trata de vencer
Alguns traumas
Remover o medo que nos paralisa
Implodir construções antigas
Repúblicas velhas e autoritárias
Vez em quando algo em nós satura
Já não somos mais espera
Somos a própria ação descontralada
O caos que reorganiza o mundo
Portanto, junho surgiu ambíguo
Com primavera e vozes alagadas
Tomando as ruas coloridas, encharcadas
Por homens que lutam por direito e cidadania
Sem Alexandre
Joca
de Oliveira
Bucéfalo,
Num certo lugar da
Macedônia,
Olhou desolado
Para os milhares de
cadáveres espalhados
Pelo campo de batalha
E ficou novamente sem
entender
A grande e eterna
luta entre os homens.
A certa distância,
Seu senhor, em toda
sua glória,
Bebia uma taça de
vinho, poder e sangue.
Decerto não pensava
como Bucéfalo
Que apenas sonhava um
prado limpo
Para poder brincar
sem esforço sob rédeas
E nenhuma autoridade
sobre seu lombo.
Área de risco
Chicão
Rasgando o mar,
Sem nenhum esforço;
Do fundo azul
O perigo avança,
E no instante
Em que a onda canta,
A fera célere materializa-se:
Abocanha a prancha,
Abocanha o sonho,
Abocanha o louco.
O jovem que eu via vivo,
Agora morto.
Abissal
Joca
de Oliveira
Não sou peixe de
superfície, de águas claras.
Peixes brilhantes,
quase à luz do sol.
Peixes de escamas, de
luz espalhada,
De cor espelhada,
como óculos modernos.
Não sou peixe que
pula à tona, à toa,
Soltando gritinhos
pros barcos que passam,
Pros transatlânticos
imunes.
Sou peixe que
mergulha fundo,
Pros territórios
abissais,
Pro escuro da pressão
deformante.
Sou peixe feio,
sozinho,
Nas lacunas dos
infernos marítimos,
De
"subvoadores".
Sou peixe amorfo, nu,
Sem cor definida,
vago,
Na profunda imensidão
do mar,
Onde me perco, eterno
infinito.
Rochas e sombras,
Algas obtusas,
cavalos daninhos,
Ostras crocantes
E tubarões de olhos
grandes e assassinos.
Sou peixe enterrado
nas esferas do habitat maior,
Onde a sobrevivência
causa pânico,
Até aos pescadores.
Sou peixe magro, de
barriga grande
E de visão presa,
dura, no perigo.
Sou peixe inquilino
da vida,
Do grande sonho de
viver.
...
¹Valmir
Jordão é poeta, compositor, performer e colaborador do
site DCP
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