CRUZ E SOUSA: O CISNE NEGRO
Postado por DCP em 28/11/2021
No
mês dedicado à reflexão sobre a consciência negra no país, o site DCP traz nesta postagem um dos mais
importantes poetas do simbolismo brasileiro: Cruz e Sousa, chamado de “o cisne negro”.
Segundo
o professor e crítico Antonio Candido, Cruz e Sousa foi o "único escritor eminente de pura raça negra na literatura
brasileira, onde são numerosos os mestiços".
Nasceu
em Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis, Santa Catarina, em 24 de
novembro de 1861.
Já
na fase adulta, no ano 1881, dirigiu o jornal Tribuna Popular, no qual combateu
a escravidão e o preconceito racial. Em 1883, foi recusado como promotor de
Laguna por ser negro. Em 1885, lançou o primeiro livro, Tropos e Fantasias em
parceria com Virgílio Várzea. Cinco anos depois foi para o Rio de Janeiro, onde
trabalhou como arquivista na Estrada de Ferro Central do Brasil, colaborando
também com diversos jornais. Em fevereiro de 1893, publicou Missal
(prosa poética baudelairiana) e em agosto, Broquéis (poesia), dando início ao
simbolismo no Brasil que se estendeu até 1922. Em novembro desse mesmo ano
casou-se com Gavita Gonçalves, também negra, com quem teve quatro filhos, todos
mortos prematuramente por tuberculose.
TRÊS POEMAS SELECIONADOS DE CRUZ E
SOUSA
A MORTE
Oh! que doce tristeza e que ternura
No olhar ansioso, aflito dos que morrem…
De que âncoras profundas se socorrem
Os que penetram nessa noite escura!
Da vida aos frios véus da sepultura
Vagos momentos trêmulos decorrem…
E dos olhos as lágrimas escorrem
Como faróis da humana Desventura.
Descem então aos golfos congelados
Os que na terra vagam suspirando,
Com os velhos corações tantalizados.
Tudo negro e sinistro vai rolando
Báratro a baixo, aos ecos soluçados
Do vendaval da Morte ondeando, uivando…
LIVRE
Livre! Ser livre da matéria escrava,
arrancar os grilhões
que nos flagelam
e livre penetrar nos
Dons que selam
a alma e lhe
emprestam toda a etérea lava.
Livre da humana, da
terrestre bava
dos corações daninhos
que regelam,
quando os nossos
sentidos se rebelam
contra a Infâmia
bifronte que deprava.
Livre! bem livre para
andar mais puro,
mais junto à Natureza
e mais seguro
do seu Amor, de todas
as justiças.
Livre! para sentir a
Natureza,
para gozar, na
universal Grandeza,
Fecundas e
arcangélicas preguiças.
ESCÁRNIO PERFUMADO
Quando no enleio
De receber umas
notícias tuas,
Vou-me ao correio,
Que é lá no fim da
mais cruel das ruas,
Vendo tão fartas,
D’uma fartura que ninguém
colige,
As mãos dos outros,
de jornais e cartas
E as minhas, nuas –
isso dói, me aflige…
E em tom de mofa,
Julgo que tudo me
escarnece, apoda,
Ri, me apostrofa,
Pois fico só e
cabisbaixo, inerme,
A noite andar-me na
cabeça, em roda,
Mais humilhado que um
mendigo, um verme…
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