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BREVE ITINERÁRIO POÉTICO DE FERNANDO BRAGA

 

Postado por DCP em 15/08/2021






Fernando Braga é poeta, ensaísta e pesquisador maranhense

Foto: Reprodução






Fernando Braga [dos Santos] é um poeta, ensaísta e pesquisador brasileiro, nascido em São Luís do Maranhão; estudou Ciências Jurídicas e Sociais, em Brasília, na Faculdade de Direito do Distrito Federal; publicou os livros de poesias: Silêncio Branco, São Luís, 1967; Planaltitude, Brasília, 1978; Campo Memória, Brasília, 1992; O Sétimo Dia, São Luís, 1997; O Puro Longe, Caldas Novas, GO, 2012; Magma, Goiânia, 2014 e Sabolim, Goiânia, 2019, dentre outros; publicou também alguns ensaios, como Elmano, o injustiçado cantor de Inês, [estudo sobre o poeta português Manuel Maria Barbosa du Bocage], 2010; Do Estado à Teoria das Elites, em meio a outros. Faz parte de algumas antologias brasileiras e estrangeiras.





SEIS POEMAS DE FERNANDO BRAGA

 

 

 

 

Meus versos*

 

“Aprendi esta língua como se consegue o amor de uma mulher”

Valéry Larbaud

 

Meus versos surgem de repente, sem anúncios

preconcebidos, e assim, a esmo e inconsúteis,

se amesendam nas múltiplas intransitividades

que na vida hei passado como poeta e bruxo.

 

Há entre mim e eles, uma brancura bipartida

em orgânica dualidade, simples e ressurgida,

numa cumplicidade inconsciente e consentida,

mas comedida, necessária, útil e dependente.

 

Há entre nós uma parceria, como se heterônimos

dalgum poeta fôssemos, onde eles, meus versos,

sorrateiros nas paráfrases se permitem comigo

 

logo no primeiro grito, sentir a dor que sinto,

mas que nunca em tempo algum deveras finjo.

Eles e eu somos um só Fernando, uma só Pessoa...

__________________________________

*Fernando Braga, in ‘O Sétimo dia’, São Luís, 1997.

Prêmio ‘Cidade de São Luís’ [Sousândrade], 1997.

 

 

Voltar não é preciso*

 

 

Lá fora o mundo me esperava,

com suas mandíbulas pesadas,

abertas e retesadas, querendo mastigar-me;

 

a guerra era santa e as lanças afiadas,

os dias eram longos e as noites eram tardas;

 

o céu imenso, o frio intenso;

e a Universidade era invadida por botas e cavalos;

 

havia gênios de lâmpadas, e dragões alados;

 

Kafka era encontrado a perambular

pela esplanada,

e teorias e conceitos varavam as madrugadas,

e poemas renasciam em noites enluaradas,

 

auroras e crepúsculos, planaltos e alvoradas;

voltar não é preciso, navegar é preciso,

 

por mares nunca dantes navegados.

 

-------------------

 

*Fernando Braga, in “Poemas do tempo comum”,

 

Prêmio Literário Gonçalves Dias, São Luís, 2009.

 

 

 

O que somos*

 

Sou feito de sangue e vísceras,

como o porto é feito de choro e pedras;

 

Sou feito de tronco e membros,

como o navio é feito de ferro e esperas;

 

Sou feito de carne e ossos,

como o mar é feito de sal e abismos;

 

Sou feito de razão e sentidos,

como o rio é feito de margens e mangues;

 

Somos todos poetas de espaços contidos,

feitos de sonhos e ajustes...

 

-----------------------------

 

*Fernando Braga, in ‘O Puro longe’, 2012.

 

 

 

 

O Puro Longe*

 

A vida é mais lírica em um cais

porque ele é feito

de saudade e esperas.

 

Estou só no tombadilho

de meu barco,

que rasga as franjas das águas

em rumo do puro longe.

 

Nada há em meu redor,

a não ser um rondó

de expectativas...

 

O puro longe, para onde vou,

não é apenas

um poema marítimo,

mas uma ode silenciosa.

 

Oh! Peso imenso!

 

Ó mar sem fundo nem margens,

onde nada acho de mim,

senão nada em tudo!

 

_________________

                                                       

*Fernando Braga, in ‘O Puro longe’, 2012.

 

 

 

Magma*

 

Esta é minha palavra,

o meu conjunto confuso

e inextricável de elementos...

É o poema que me busca

e me traz para a superfície,

para que eu possa dizer-me

e ouvir-me tantas vezes,

e expor-me a pensamentos

aonde sou sujeito e objeto...

Este é o magma do meu

logos racional,

do meu dever-ser

 

_____________________

 

Fernando Braga, in ‘Magma’, Goiânia, 2014.

 

 

 

 

Inteiro teor*

 

Sem mais o fio

que me sustém

no vago espaço,

caio em queda

livre por sobre

telhados verdes

de séculos;

 

no corpo vago

da palavra,

o vão exercício

de barro e cal,

reprisa

prescritos

pósteros

e proscritos

príncipes;

 

escápulas e muros

saem dos becos

dos meus sentidos

para a noite escura

do meu desterro;

 

poemas há, nos versos

terços de meu rosário,

a declinar o ablativo:

verbo ‘ad verbum’.

 

_________________________

 

*Fernando Braga, in ‘A cor do verbo’. Inédito.



BREVE ITINERÁRIO POÉTICO DE FERNANDO BRAGA BREVE ITINERÁRIO POÉTICO DE FERNANDO BRAGA Reviewed by Natanael Lima Jr on 23:43 Rating: 5

Um comentário

  1. Não há como ler Fernando sem penetrar na beleza do conteúdo dos seus versos. Eles são plenos de sentimentos profundos que levam a navegar até o infinito.

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