O VOO DA ETERNA BREVIDADE
Imagem: capa divulgação
Por José Luiz Mélo
“O Voo da Eterna Brevidade”, de José
Mário Rodrigues, que chegou para os seus leitores no final do ano passado em
primorosa edição da CEPE, com capa de José Cláudio, é um Livro de Poesias, mas,
também uma obra de arte, daquelas que se veem nas mesas de centro das salas de
estar, silenciosas e mudas em sua beleza nostálgica de damas antigas,
bem-comportadas.
Nele, José Mário organiza os seus
poemas em dez grupos que denomina de Livros. Deles, o primeiro, do original
publicado ainda em 1973 na mais frondosa floração da Geração 65, a “Estação dos
Ventos”, até sua penúltima obra catalogada na orelha da contracapa, “Trem das
Nuvens”, publicada em 1997.
José Mário, na sua poesia, usualmente
fala para alguém, na primeira pessoa, “uns grandes olhos me perseguem, veem
onde estão minhas mãos”; ou ainda, impessoal: “o pecado sentado à mesa e me
queria, eu queria o pecado”.
Vejo na poesia de José Mário, uma
clareza quase geométrica das imagens na construção do verso, nunca afundam nem
desaparecem por entre sombras enevoadas: “A estação dos ventos se alonga entre
cavalos e bois que não pressentem o veneno das cobras e desconhecem os defuntos
enterrados no descanso eterno das sombras.” “Sou um sino que envelheceu. Vim
para escrever poemas que morreram inéditos em idiomas mortos.”
DOIS POEMAS DE JOSÉ MÁRIO RODRIGUES
A
IMORTALIDADE
Oh! Minha paixão
pobre, insegura, desenfreada paixão
fique apenas mais um pouco.
Não há tempo a perder.
um reator atômico
vai desfazer nossas lembranças.
Dessa lagoa,
desses peixes
e do verde nada restará.
E quando tudo não mais estiver,
não existirá o caos
mas uma fumaça no ar.
E isso é o que vão chamar de
imortalidade.
CONQUISTA
Acorda-me
a voz do morto
e
o falar desnecessário dos vivos
me faz
adormecer.
Dá
muito trabalho ser feliz.
Tiram-me
o sossego esses abandonados:
ora
avançam sobre os relógios
ora
acomodam-se entorpecidos
pelas
calçadas.
Os
assassinatos, os sequestros, os assaltos
não
mudam apenas os destinos:
nos
calam pelo espanto.
Por
isso, agora,
o
esquecimento é minha conquista.
Dá
muito trabalho ser feliz.
O VOO DA ETERNA BREVIDADE
Reviewed by Natanael Lima Jr
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05:01
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