ENTREVISTA COM O ESCRITOR PAULO CALDAS
Postado por DCP em 21|08|2022
Entrevista concedida a
Maria de Lourdes Hortas
“Oficina não ensina ninguém a ser poeta, mas se existe amor ao que se faz, ela dá aquela “mãozinha” essencial ao ofício”.
Paulo
Caldas nascido em Recife iniciou a carreira em 1980, com a
versão de No tempo do nosso tempo, reunião de crônicas sobre a juventude
do Recife nos inesquecíveis anos 1960, em parceria com o cronista Evaldo
Donato, com o selo das Edições Pirata. Lançou Anatomia do baixa renda, crônicas
bem-humaradas sobre o cotidiano do cidadão dos subúrbios. Em seguida os
infantis: Era uma vez um quintal, na Semana da Criança 1982; Era uma
vez a fazenda e assim a fase da sua carreira ficou marcada como o tempo dos
bichos humanizados, anti-heróis criados como antítese dos super-heróis. Estava
travado o voo. Em 1985 lançou Asas pra que te quero?. Em 1988 publicou Esses
bichos maravilhosos e suas incríveis aventuras, pela Editora Atual de São
Paulo. E na sequência lançou, República dos bichos (1991), Destino
cidade (1993), Alma de artista (1994), O fascínio da caixa preta (1994),
A tecla sigma (1995), Um anjo chamado alegria, Lua em
sagitário, Os olhos do dono, Sob um céu de domingo, Porto
dos amantes (finalista do prêmio Vânia Carvalho da APL, em 2012). Em 2013 Círculo
amoroso, resumo de versos às musas imaginárias, chegou na final do Prêmio
Edmir Domingues (Poesia), também da APL. Em 2019, Numa rua perto do centro,
o lançamento mais recente, foi ambientado em casas de prostituição.
Maria de Lourdes Hortas - Quem é
Paulo Caldas?
Paulo Caldas - Um prestador
de atenção com um milímetro de verve acima da média.
MLH - Como
aconteceu a sua estreia na literatura?
PC - Por conta da
verve, lá em 1979, comecei a rabiscar o comportamento da juventude do Recife
nos anos de 1960. Ganhei incentivo da antiga turma do bairro, que era citada no
texto, e a parceria de um contemporâneo, Evaldo Donato, eficiente na arte do
bem escrever. Terminamos a obra em 1980 e por intermédio do artista plástico
Silvio Malincônico, companheiro de ‘peladas’, cheguei a Tarcísio da Livro 7.
Daí fui apresentado a Jaci Bezerra,
poeta famoso, líder do movimento literário Edições Pirata. Entreguei aquela
massaroca de papel e fotos em preto e branco, que, em setembro daquele ano,
transformou-se na primeira edição de “No tempo do nosso tempo”.
Tomei gosto na parada e comecei a
acompanhar os piratas nas incursões no mar das letras. Recebi a missão de fazer
livros infantis para o selo Piratinha e fiz dois.
MLH - Nos anos
1980, você fez parte do grupo dos Escritores Independentes do Recife. Fale um
pouco desse momento e do que o mesmo significou para você?
PC - Nos anos de
1980, naveguei nas águas do Rio Una, com a vinda da Edições Bagaço de Palmares
para o Recife e conheci novos portos. Naquele momento, com as Edições Pirata, o
surgimento da Bagaço e a dinâmica dos Escritores Independentes, a vida
literária ganhou impulso por aqui. Considerando que Pernambuco é campo fértil
no cultivo das artes, essas manifestações resgatavam antigos talentos,
revelavam novos.
No plano pessoal, passei dos infantis
aos adolescentes até publicar a primeira edição de Flores para Cecília,
em 1996. Daí se deu o embarque em temas para o público adulto a partir de Um
anjo chamado alegria, em 2005, ambientado num circo mambembe.
MLH - O que, a sua longa experiência
como editor, acrescentou à sua vida? Foi um sonho, uma aventura, ou um projeto
editorial?
PC - A experiência
em edição de livros serviu e ainda me serve como atividade remunerada, quando
passei do sonho à responsabilidade. São incontáveis os autores que já trouxe ao
público, tanto no período que militei na Bagaço, quanto nos dias de hoje,
trabalhando em faixa própria.
MLH - A sua
escrita tem várias veredas: você iniciou escrevendo livros infanto-juvenis, mas
também escreve contos, romance e poesia. De todos esses gêneros, em qual se
sente mais à vontade, qual deles lhe dá maior prazer?
PC - Esta questão
passa por uma pinguela entre as fases anterior e após a participação, por dez
anos consecutivos, na Oficina de Criação Literária Raimundo Carrero: os textos
definidos como paradidáticos ficaram para trás e, me achando maduro, nos
últimos 15 anos lancei além de Um anjo chamado alegria, Lua em
sagitário, Os olhos do dono, Sob um céu de domingo, Porto
dos amantes (finalista do prêmio Vânia Carvalho da APL, em 2012). Em 2013 Círculo
amoroso, resumo de versos às musas imaginárias, chegou na final do Prêmio
Edmir Domingues (Poesia), também da APL. Em 2019, Numa rua perto do centro,
o lançamento mais recente, foi ambientado em casas de prostituição.
Chego ao orgasmo com qualquer texto que
me faça bem e trabalho bastante pra chegar a este clima. Noutro dia, revendo
Lua em Sagitário, chorei. Por momentos duvidei que fora capaz de escrever
aquilo.
MLH - E, dentro
dessa variedade de gêneros literários, qual seria o seu ponto de partida no
momento de se definir por um deles: uma ideia, uma frase, uma palavra?
PC - O “clik”
sempre vem, independente do gênero, seja uma visita à memória, uma frase ouvida
ou lida. Ontem ouvi numa música “a lua chegou mais cedo, como se não tivera
nada para fazer”, mais ou menos isso. Dalí, quem sabe, nasce um verso, a fala
de uma personagem, etc. O escritor é sempre provocado por símiles, metáforas,
imagens e sons, né?
MLH - Paulo, uma
outra atividade a que você se vem dedicado é a das Oficinas Literárias. Qual
seria a função dessas oficinas? Você acredita, sinceramente, que alguém pode
aprender a ser poeta?
PC - Uma vez ouvi
de um palhaço de circo mambembe: “arte se faz com amor, sem amor nada
acontece”. As pessoas nascem com verve, uns mais outros menos. Oficina não
ensina ninguém a ser poeta, mas se existe amor ao que se faz, ela dá aquela
“mãozinha” essencial ao ofício. Por que as oficinas de Carrero, Marcelino
Freire e outras conseguem longevidade? A nossa vai com uma dúzia de anos
vividos. Outro detalhe é o sentimento de ajuda mútua, espontâneo, desinteressado.
Nos nossos encontros é comum a gente ouvir:
- Fulano, usei aquela intertextualidade
que você sugeriu na cena tal.
- Massa. Diz aí como ficou. Vou vestir a
personagem com mais sobriedade, o que você acha?
Outro dia vi um um bando de formigas
carregando uma batata frita que caíra no chão e pensei: lá vai a turma da
oficina.
A adesão de autores à nossa coletânea
anual satisfaz a necessidade de afirmação dos participantes; é ver o nome na
mídia, vivenciar a festa do lançamento, os convidados chegando, os pedidos de
autógrafos. Pense.
MLH - Como
editor, qual a sua opinião sobre o e-book? Acha que já tem um grande número de
leitores? E quanto às redes sociais, parecem-lhe um bom suporte para a
literatura no mundo contemporâneo?
PC - O e-book e
congêneres são alternativas válidas, imagino que aos poucos vão ampliar os
espaços numa espiral ascendente. As mídias sociais, todas, exigem que a pessoa
leia e leia o que escreve, encaro como fato positivo.
MLH - Foi um
grande prazer contarmos com a sua participação no DCP. Gostaria de deixar
alguma mensagem aos nossos seguidores?
PC - O que me
preocupa é o avanço das redes sobre nossa cultura. Aliás desde que convivemos
com programas de rádio e TV em rede, papagaio passou a se chamar pipa,
bicicleta de bike e a brincadeira de academia virou amarelinha.
Atualmente nem mais criamos nosso jeito
de falar e nos expressamos tal uma fita gasta a reproduzir o que ouvimos;
qualquer pergunta que se faça a alguém, atualmente, a resposta, começa com a
palavra “então”.
- Boa noite, Fulana, como foi o filme?
- Então. Nossa, meio que, tipo assim, sério? Imagina...
Parabéns à Lourdes pelas provocações poéticas ao Paulo Caldas, grande escritor!!!
ResponderExcluirÓtima entrevista com o escritor Paulo Caldas, parabéns ao DCP.
ResponderExcluirAgradecemos o comentário e volte sempre!
ExcluirÓtima entrevista com o amigo .
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