ENTREVISTA COM O JORNALISTA MARCELO MÁRIO DE MELO
Postado por DCP em 24|07|2022
Entrevista
concedida a Maria de Lourdes Hortas
De uma maneira geral, considero positivo tudo o que amplia o acesso à leitura, às fontes de conhecimento e ao intercâmbio entre as pessoas, como o livro, o jornal, o telefone, a TV, a internet. Mas de tudo isso se pode fazer um bom ou mau uso, assim como a energia nuclear gerou a bomba atômica.
Marcelo
Mário de Melo é jornalista, nasceu em Caruaru e veio
para o Recife aos nove anos. Escreve poema, história infantil, miniconto, texto
de humor teatro, artigo e nota crítica. Considera-se um artesão-aprendiz de
literavida e escreve considerando que a pessoa é um animal político e o animal
político é uma pessoa. Poeta materialírico, entende que o exercício poético não
se deve transformar numa nova modalidade de culto, porque já existe religião
demais no mundo. Foi preso político durante a ditadura de 1964, durante 8 anos,
43 dias e 19 horas, de 1971 a 1979. Publicou: Os quatro pés da mesa posta,
poesia, Edições Pirata, 1980; Manifesto masculinista, Ed. do Autor,
1993; Entre teias e tocaias/David Capistrano, perfil parlamentar,
Assembléia Legislativa de Pernambuco, 2001; Perfil parlamentar de Josué de
Castro, Câmara dos Deputados, 2007; Manifesto da esquerda vicejante,
Ed. do Autor, 2008; Os colares e as contas - poemas político, Funcultura
Pernambuco, 20122; Rumos resistência - poesia e cidadania/2a edição do
Manifesto masculinista, NEP - Núcleo de Estudos Política, Economia e
Sindicalismo/MMM Produtos Culturais, 201'7; Dicionário poético militante,
MMM Produtos Culturais, 2018; AdVersos resistentes, MMM Produtos
Culturais, 2019; Literavidahortas - histórias e casos, Funcultura
Pernambuco, 2019. Participa das antologias: Estação Recife, coletânea poética,
Prefeitura do Recife, 2004; Pernambuco terra da poesia, Instituto Maximiano
Campos-Leitura, 2005; Amigos do cordel 1 – movimentos sociais, Prefeitura do
Recifre, 2008; coletânea de textos de humor, Prefeitura do Recife, 2007; Poemas
para exumar a história viva, Cult editora, 2021.
Maria
de Lourdes Hortas - Por que escreve?
Marcelo
Mário de Melo - Escrevo por necessidade de expressão.
A poesia é a minha tradução simultânea da vida e se manifesta como uma coceira
que não pede permissão e dá em qualquer canto das inquietações da vida.
MLH
- Para você, o que é a poesia?
MMM
-
A poesia, para mim, é o olhar que mergulha e voa, a quinta parede do sonho que
vai além das quatro paredes do dia a dia enquadrado.
MLH
- Acredita que a poesia tem uma utilidade, uma função, ou parece-lhe uma
atividade meramente lúdica?
MMM
- Acredito que a poesia tem uma função vital de libertação muito ampla,
envolvendo os aspectos lúdicos e críticos, o encanto e o espanto, o
deslumbramento e a revolta, a curtição e o engajamento.
MLH
- Você estreou na literatura na década de 80, um tempo, em nosso país, de grande
repressão, quando as diversas expressões de Arte assumiram cores
panfletárias: esse cenário influenciou a
sua escrita? Você se considera um poeta de denúncia? A Poesia pode ser uma
espécie de arma?
MMM
- O lançamento do meu primeiro livro se deu em 1980. Mas o meu processo de
criação poética é anterior, de fins nos anos 60, e foi fortemente influenciado
pelo clima de repressão e resistência instalado coma ditadura de 1964. Entrei
na militância de esquerda aos 16 anos e no Partido Comunista aos 17, em 1961.
Meu contato com a literatura, o amor e a política se deram entrelaçados, assim
como os seus reflexos na minha produção poética. O meu livro de estreia foi uma
coletânea de 38 poemas escritos na prisão. Mas isto não quer dizer que
escrevesse apenas sobre questões políticas. E que, quando o fizesse, tratasse
apenas de denúncias. Mesmo na seara da poesia política, tenho poemas não só de
denúncia, chamados de panfletários, mas também de reflexão crítica sobre os
próprios caminhos e descaminhos da militância. Considero-me um poeta que
escreve poesia militante como uma das vertentes da sua produção poética e é
mais conhecido por esse aspecto, que constitui um entre cinco leques. Os outros
são os poemas reflexivos (filosovida), psicológicos psipoemas), amorosos
(lavramor), metalinquísticos (palavra-pá). Para mim a poesia pode sim ser
considerada uma arma, uma ferramenta, atuando sobre estes cinco leques que
sintetizam os labirintos da condição humana.
MLH
- Lembro-me bem do seu livro de estreia: Os quatro pés da mesa posta, pelas
Edições Pirata, movimento literário do Recife. Como foi esse momento para você?
Você faz parte da chamada Geração 65?
MMM
- O meu livro de estreia, os Quatro Pés da Mesa Posta, foi organizado e
editado por mim em fins de 1979 e vim do Rio de Janeiro com ele em ponto de
impressão, para ser impresso na Editora Universitária, com o apoio do
companheiro Moacir Sena Dantas, diretor da gráfica. Conversando com Jaci
Bezerra, ele me falou de um lançamento coletivo das Edições Pirata e propôs que
o meu livro se incluísse, com o selo da Pirata, que não considero movimento
literário, mas movimento editorial de muita importância na época. Quanto à
Geração 65, não faço parte dela, por desconsiderar a existência de uma geração
municipal. Lembrando que, pelo fato de em todas as edições da Pirata figurar o
selo "Geração 65", pessoas que estrearam literariamente em fins dos
anos 70 e no início dos anos 80, passarem a se incluir e a serem incluídas na
Geração 65, que passou a ser um selo apetitoso.
MLH
- Há muito tempo, um grande poeta disse que a vida imita a arte. E você, o
que diria?
MMM
- Acho que a vida e a arte se imitam e a literavida faz a síntese.
MLH
- Quais são os seus “padroeiros poéticos”?
MMM
- Meus primeiros contatos com a poesia foram nos antigos livros de leitura do
curso primário e ouvindo os vendedores de folheto de cordel "cantando o
romance" em rodas, na feira de Caruaru, além de os ler. Depois, tiro o
chapeu para Camões, Fernando Pessoa, Bretch, Maiacoviski, Drummond, João
Cabral, Bandeira, Castro Alves, Zé Limeira, Oswald de Andrade e Manoel de
Barros.
MLH
- Como vê a poesia brasileira de hoje? E a poesia universal?
MMM
- Por desconhecimento, não posso falar da produção poética brasileira em termos
gerais, nem da poesia universal. Apenas registro, considerando o noticiário, o
surgimento de novos valores e uma presença maior de mulheres na seara. Também
destaco a existência de excelentes publicações de crítica e difusão da poesia,
sob forma impressa e virtual, do que é exemplo este DCP.
MLH
- Duas perguntas que gostamos de fazer aos que escritores que aqui vêm: as
redes sociais podem ser bons veículos para a literatura? E o e-book, você acha
que poderá substituir o livro físico?
MMM
- De uma maneira geral, considero positivo tudo o que
amplia o acesso à leitura, às fontes de conhecimento e ao intercâmbio entre as
pessoas, como o livro, o jornal, o telefone, a TV, a internet. Mas de tudo isso
se pode fazer um bom ou mau uso, assim como a energia nuclear gerou a bomba
atômica. O desafio é enfrentar as expressões de superficialidade,
subcultura e manipulação que resultem da emergência da mídia eletrônica, assim
como as indústrias jornalística e editorial, no passado, geraram a imprensa
marrom e a subliteratura. Mas também abriram espaço para edificantes
experiências nas duas áreas. Na essência, o problema continua o mesmo, com
novas vestimentas. Ao lado dos agravos pós-modernos, muitas velhas cartas
manuscritas são reenviadas por e-mail.
MLH - Que recado gostaria de deixar aos seguidores do Domingo com Poesia?
MMM -
Aos leitores do DCP desejo que continuem interessados em ler poesia e, também,
depoimentos e entrevistas de poetas falando sobre os seus processos criativos, e
não se esquecerem de roçar os olhos nos poemas sobre poesia. Mas acima de tudo
e além dos livros, procurem a sintonia com a dimensão poética da vida e a
poetização do cotidiano, nas trilhas da poesia prática e com a certeza de que o
mais importante é viver poeticamente.
O final da entrevista do grande MMM é antológico: o fundamental é encontrar a “dimensão poética da vida”.
ResponderExcluirChico de Assis
grande Marcelo, um prazer ler sua entrevista no avarandado do meu domingo
ResponderExcluirgrande Marcelo, um prazer ler sua entrevista no avarandado do meu domingo
ResponderExcluirsonia marques, colega de roda de poesia
Marcelo Mário de Melo muito bem antenado : "De uma maneira geral, considero positivo tudo o que amplia o acesso à leitura, às fontes de conhecimento e ao intercâmbio entre as pessoas, como o livro, o jornal, o telefone, a Tv, a internet..."
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