ENTREVISTA COM O ESCRITOR E POETA ANTONIO CARLOS SECCHIN



GRANDES ENTREVISTAS




Antonio Carlos Secchin
Foto: Fernando Rabelo/Divulgação 





Antecipando as comemorações do 9º ano de resistência do site “Domingo com Poesia”, temos a satisfação e a honra de trazer para os nossos seguidores a entrevista exclusiva com Antonio Carlos Secchin, concedida ao editor deste site. Nesta entrevista o escritor fala para que serve a poesia, sobre o centenário do poeta João Cabral de Melo Neto e a importância da sua obra para a literatura brasileira, entre outros assuntos.

Secchin nasceu no Rio de Janeiro, em 1952. É poeta, ensaísta, ficcionista, Membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) e professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Autor de 15 livros autorais, além críticas, ensaios e organizador de edições de obras poéticas de nomes como: Cecília Meireles, João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar. Todos os ventos (poesia), ganhador de três prêmios para melhor livro do gênero publicado no Brasil em 2002. Em 2018 publicou, na área da literatura infantil, O galo gago, que foi contemplado com o Selo 10 da Cátedra de Leitura da UNESCO e, Selo “Altamente Recomendável”, da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. A obra Percursos da poesia brasileira, do século XVIII ao XXI, laureada com o Prêmio da APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte) como o melhor livro de ensaios publicado no país em 2018. Em 2019, recebeu o Grande Prêmio da Cidade do Rio de Janeiro, da Academia Carioca de Letras, pelo conjunto de sua obra. Sem sombra de dúvidas, Secchin escreveu seu nome no cânone literário brasileiro e se consagrou pelo conjunto da sua obra, como um dos maiores poetas e escritores contemporâneos do país. 


*Conheça mais sobre Secchin acessando: http://www.academia.org.br/academicos/antonio-carlos-secchin




DCP - Além da sua brilhante produção poética, você é reconhecido nacionalmente por escrever ensaio, ficção e crítica literária. Qual o gênero que Antonio Carlos Secchin mais se identifica? Poderia nos dizer sucintamente a razão desta sua identificação?

ACS - Sou, ou ao menos pretendo ser, basicamente poeta. Mas a poesia não se restringe ao território do poema. A crítica, por exemplo, pode reinvidicar seu estatuto de invenção, pois, como a poesia, também trata de multiplicar sentidos. Minha identificação é com tudo que aponte para isto: a pluralidade.

DCP - Para que serve a poesia?

ACS - Para nada. Essa é uma grande função, não ter nenhuma, quando tudo deve servir para algo. Ou então serve para mudar sua vida, o que não é pouco.

DCP - Nestes tempos de informações frenéticas, qual seria a função social da poesia e do poeta?

ACS - Desconfiar do frenesi. Indicar que há muitas temporalidades, e que o tempo da poesia, ao contrário da cultura do instantâneo, é necessariamente lento, numa demanda não do reflexo imediato da realidade, mas da reflexão.

DCP - Existem duas ideias sobre a poesia brasileira que são bem polêmicas. A primeira diz que um dos seus traços dominantes é o diálogo cerrado com a tradição. A segunda ideia, decorrente da primeira, diz que essa linhagem modernista se bifurca em dois eixos principais: uma vertente mais lírica, subjetiva, articulada em torno de Mário de Andrade, Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade; e outra mais objetiva, experimental, formalista, representada por Oswald de Andrade, João Cabral de Melo Neto e a poesia concreta. Esse esquema apresentado tem apenas função meramente didática? Qual a sua opinião?

ACS - Em linhas gerais, os caminhos são, mais ou menos, esses que você apontou. Mas não são excludentes, há ramificações que podem uni-los, embora o dogmatismo de algumas seitas pretenda vê-los como incompatíveis. A propósito, publiquei, no livro Desdizer, o “Poema promíscuo”:

Disseram que voltei muito mecanizado,
com ritmo correto, muita rima rica,
que não tolero nada que não seja aquilo
que seja exatamente o que o Bilac dita. 

Disseram que com a forma estou bem preocupado,
e corre por aí, com a maior certeza,
que muito pouco vale tanta velharia
de alguém que ainda pensa em produzir beleza.

Não sei o que o futuro guarda de armadilha,
porém não vou ficar parado e prisioneiro
de quem, pajé pujante em sua antiga taba,
dali pretende governar o mundo inteiro.

Pra cima da poesia não vale esse veneno,
que já destila seu sabor de cianureto.
Enquanto a tribo grita “Por aí não passa”,
passa um poema concreto ao lado de um soneto.



DCP - A palavra que nomeia, a palavra que traduz, a palavra que semeia – estas são a munição do poeta?

ACS - Considerando o título de meu mais recente livro, o poeta, antes de dizer, deve desdizer: não só o discurso alheio, mas o seu próprio. Duvidar de tudo – até de sua dúvida.

DCP - Podemos avaliar um autor ou uma obra com base em sua repercussão midiática?

ACS - Sim, se, com isso, quisermos, quase sempre, chegarmos a uma avaliação inteiramente equivocada.

DCP - Neste ano de 2020 comemora-se o centenário do poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto. Em sua opinião, qual a importância da sua obra para a literatura brasileira?

ACS - Foi dos raros que propuseram um novo conceito de poesia. Não aprofundou a herança de seus possíveis antecessores: tratou de fundar um outro caminho. Na radicalidade de sua proposta, inimitável.

DCP - A grande maioria dos leitores consideram “Morte e vida Severina”, a obra-prima de João Cabral. Você como profundo estudioso e leitor da sua obra também concorda?

ACS - O poeta costumava desvalorizar essa obra, para, a meu ver, chamar a atenção para as demais, ensombrecidas pelo extraordinário sucesso de Morte e vida. Mas a poesia de Cabral é banquete para muitos paladares, em nível de alta consistência. Gosto muito de O cão sem plumas e Uma faca só Lâmina.

DCP - As novas tecnologias contribuem na divulgação da produção literária brasileira?

ACS - Antigamente, o pequeno público leitor ignorava a poesia. Com as novas tecnologias, o imenso público leitor continua a ignorá-la.

DCP - Qual a sua opinião sobre os livros digitais (ebooks)?

ACS - Tudo bem, mas como, além de gostar de literatura, gosto de livros, ainda não sei como fazer para conseguir um e-book autografado.

DCP - Quais os seus próximos projetos literários?

ACS - Este ano estou bastante concentrado nas comemorações do centenário de João Cabral. Duas publicações devem sair em breve: pela Alfaguara, a Poesia Completa, com a inclusão de dezenas de poemas inéditos. E, pela CEPE, do Recife, “João Cabral de ponta a ponta”, obra com cerca de 500 páginas, em que estudo todos os vinte livros do grande poeta.

ENTREVISTA COM O ESCRITOR E POETA ANTONIO CARLOS SECCHIN ENTREVISTA COM O ESCRITOR E POETA ANTONIO CARLOS SECCHIN Reviewed by Natanael Lima Jr on 05:01 Rating: 5

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