CONTO DO DOMINGO
A
casa dos sete gatinhos (conto) de Fernando Farias
Foto:
reprodução
Quem passa de carro na avenida apresada apenas percebe o muro coberto de
cartazes acumulados de várias eleições. As mangueiras escondem da paisagem a
velha casa abandonada. Arquitetura típica da década de 60, linhas inclinadas e
cobertas de azulejos verdes e amarelos desbotados pelo tempo. Na varanda,
cadeiras de bambus apodreceram.
O
que era antes um jardim é um matagal que cobre até o portão com ramas de
trepadeiras. O quintal é uma selva fechada pelas goiabeiras entrelaçadas. Um
habitat de lagartixas pretas, que servem de alimentos para os gatos que entram
e saem da casa através das molduras dos vidros quebrados dos postigos das
janelas.
Coberta
por telhas inglesas, a maioria rachada e escurecida, por onde as goteiras e os
raios do sol penetram pelas paredes sujas até o piso; assoalhos de tacos de
madeira, revestidos de poeira, folhas secas e fezes dos gatos.
A
ninhada que nasceu no sofá azul e mofado, brinca com as bolinhas de gude
coloridas, encurraladas entre as paredes cobertas de fotografias e imagens de
santos que o ar desbotou.
Os
gatinhos saltitantes brincam fazendo as bolinhas rolarem se espalhando pela
sala, corredor, até o banheiro de louças encardidas pela ferrugem; a cozinha
destruída pela maresia e um quarto coberto pela umidade da salina e o lodo
ressecado, a poeira cobre o espelho da penteadeira.
A
bolinha azul rola até o guarda-roupa com as portas abertas. De um lado, as
calças de tergal e camisas mofadas de homem, do outro, um tubo de batom e
pequenas teias de aranhas.
Ao
canto, em cima de uma mesinha coberta com paninho de renda de crochê encardido,
há um bilhete rabiscado a lápis, numa folha rasgada de um caderno, onde, ainda,
se pode ler:
“Querida,
eu te amo! Eu sei que você vai voltar. Me acorde quando chegar.”
Apesar
da brincadeira barulhenta dos gatinhos, a mamãe-gata dorme tranquilamente na
cama, aos pés de um esqueleto humano coberto com um lençol de algodão.
No
piso do quarto, a réstia do sol desliza silenciosamente.
*Transcrito do livreto Entre sete estrelas / Coleção “O livro azul”
*Fernando Farias é escritor e contista pernambucano. Coordena atualmente o projeto “Um
escritor na minha escola”, em Jaboatão dos Guararapes.
CONTO DO DOMINGO
Reviewed by Natanael Lima Jr
on
13:44
Rating:
Dez
ResponderExcluirGosto desse conto. Muito bom Fernando. Eu não faria... Abçs!
ResponderExcluirGosto desse conto. Muito bom Fernando. Eu não faria... Abçs!
ResponderExcluirSuas palavras descritivas pintam imagens poéticas.
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