A Poesia Severina de João Cabral de Melo Neto
por
Natanael Lima Jr*
Foto: Oscar Cabral / João Cabral de
Melo Neto (1920 – 1999)
João
Cabral de Melo Neto nasceu na cidade do Recife (PE), no dia 09 de janeiro de
1920, na Rua da Jaqueira. Primo do poeta Manuel Bandeira e do escritor Gilberto
Freyre. Passou parte da sua infância na área rural pernambucana, primeiro no
Poço do Aleixo, em São Lourenço da Mata, e depois nos engenhos Pacoval e Dois
Irmãos, no município de Moreno. É considerado um dos maiores poetas da Geração
de 45 (movimento que se contrapõe aos “excessos do modernismo”). Desde jovem
mostrou interesse pela literatura e, em especial, pela literatura popular
(cordel). Apesar de ser cronologicamente um poeta da Geração de 45, João Cabral
seguiu um caminho próprio, recuperando certos traços da poesia de Drummond e Murilo Mendes, como a poesia substantiva e
a precisão dos vocábulos, produzindo uma poesia de caráter objetivo numa
linguagem sem sentimentalismo e rompendo com a definição de “poesia profunda”
utilizada até então. Para o poeta, “a poesia não é fruto de inspiração em razão
do sentimento”, mas de transpiração: “fruto do trabalho paciente e lúcido do
poeta”.
A
primeira obra de João Cabral, Pedra do sono (1942) apresenta uma declinação
para a objetividade e imagem surrealista. Já em O engenheiro (1945), percebe-se
que o poeta se afasta da linha surrealista, pendendo para a geometrização e
exatidão da linguagem, como se ele próprio fosse o engenheiro, economizando as
palavras (o material como se constrói) e a objetivação do poema (o propósito do
uso do material – a construção terminada).
Nas
suas principais obras, como O cão sem plumas (1950), O rio ou relação da viagem
que faz o Capibaribe de sua nascente à cidade do Recife (1954), Quaderna
(1960), Morte e vida Severina (1965), A educação da pedra (1966), Funeral de um
lavrador (1967), Museu de tudo (1975), A escola das facas (1980), Poesia
crítica (1982), Agrestes (1985) e Sevilha andando (1989), o poeta revela uma
preocupação com a realidade social, principalmente com a do Nordeste
Brasileiro; reflete constantemente sobre a criação artística (Catar feijão –
poema); aprimora a poética da linguagem objeto, definida como a linguagem que,
pela própria construção, sugere de que assunto aborda (Tecendo a manhã –
poema). Essa característica de sua obra constitui a principal referência do
movimento concretista da década de 50 e 60 e de vários poetas contemporâneos, como
Arnaldo Antunes, entre outros.
Morte
e vida Severina (auto de natal pernambucano) é a sua produção mais popular.
Nela, o poeta mantém a tradição dos autos medievais, fazendo uso da
musicalidade, do ritmo e das redondilhas. Ela foi encenada pela primeira vez em
1966 no Teatro da PUC em São Paulo, com música de Chico Buarque. Foi premiada
no Brasil e na França e, a partir daí, vem sendo encenada diversas vezes e até
adaptada também para a TV. O poema narra à caminhada do retirante Severino,
desde o sertão até sua chegada em Recife e, além das denúncias de certos
problemas sociais do Nordeste, constitui uma reflexão sobre a condição humana.
João
Cabral é considerado pelos críticos “não apenas um dos maiores poetas sociais,
mas um renovador consistente, instigante e original da dicção poética antes,
durante e depois dele”. Ele e Graciliano Ramos possuem o mesmo grau ético e
artístico, um na poesia, o outro na prosa, que objetiva com precisão uma
prática poética comum: deram à paisagem nordestina, com suas diferenças
sociais, uma das dimensões estéticas mais fortes, cruéis e indiscutíveis que já
se conheceu.
*Natanael
Lima Jr
é poeta, pedagogo e produtor cultural
Fontes:
CEREJA,
William Roberto e MAGALHÃES, Thereza Cochar. Literatura Brasileira em diálogo
com outras literaturas. 3 ed. São Paulo, Atual editora, 2005, p.535-40.
SARMENTO,
Leila Lauar. Português: Literatura, Gramática e Produção de Texto. São Paulo,
Moderna, 2004, p. 172-4.
Arquivo:
Carta
de Poetas – http://www.domingocompoesia.com.br
A Poesia Severina de João Cabral de Melo Neto
Reviewed by Natanael Lima Jr
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10:09
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Excelente, Natanael. A poesia de João Cabral abordada sobre o aspecto do aprimoramento da poética, onde foi um dos pioneiros, e a preocupação com a realidade social particularmente, a dos nordestinos.
ResponderExcluirOlá Jade, fico feliz por vc ter gostado do texto.
ExcluirRealmente, o texto de Natanael abrangeu de maneira sutil, mas profícua, todos os aspectos da poética de João Cabral. Parabéns Poeta.
ExcluirParabéns! Natanael, excelente texto, você consegui-o com poucas palavras mostrar a vida e a obra de JCMN.
ResponderExcluirValeu Natanael, mais uma contribuição do DCP à literatura brasileira. Belo texto!
ResponderExcluirAdriano Marcena
Que bom Marcena que você gostou, trabalhamos sempre com o propósito de contribuir com o debate literário.
ExcluirLi como prometi e gostei, obrigada por ter me lembrado para ler o texto, pois como a sua vida, a minha também é cheia de projetos a realizar, Abração Natanael e saudades de Spencer. Madame Ametista.
ResponderExcluirOlá Damaris, agradecemos a sua visita. Bom que gostou. Volte sempre!
ExcluirQue bom que gostou do texto, Natanael classificou com muita maestria a poética de João Cabral. Um forte abraço.
ExcluirPrezado Natanael
ResponderExcluircomo estudiosa do homem e do poeta João Cabral sempre me emociono ao ver o interesse que nosso poeta desperta a despeito do tempo....Sem dúvida é um clássico ; clássico "mediterraneo-tropical";fez do Nordeste e da Andaluzia sua geopoética e , como todo clássico, trabalha a mimese das figuras e paisagens e com elas nos dá lição de estilo.
ele fez em poesia o que Craciliano fez na prosa; elevaram o regional ao nível do estético universalizando-o.
Gostaria de enviar-lhe um exemplar do meu ensaio/biográfico JOAO CABRAL DE MELO NETO- retrato falado do poeta (CEPE 2009).aguardo seu endereço, abs, Selma Vasconcelos
Olá Selma, enviei o meu email. Agradecemos seu contato.
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