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ENTREVISTA COM O POETA E ENSAÍSTA PAULO GUSTAVO

 

Postado por DCP em 07/08|2022

 

Entrevista concedida a Natanael Lima Jr.






Paulo Gustavo | Foto: Reprodução






“Enquanto uma educação inclusiva e de qualidade não se incluir em nosso projeto de nação, sempre haverá pouco respeito por autores, artistas e cientistas. É com educação que se criam plateias, públicos, gostos e, consequentemente, respeito e memória”.






Paulos Gustavo de Oliveira estudou no Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco; é Bacharel em Letras (Português) e Mestre em Teoria da Literatura pela mesma universidade. Ex-servidor concursado da Fundação Joaquim Nabuco, foi editor da Editora Massangana e editor-assistente da revista Ciência & Trópico. É sócio-fundador da Consultexto — consultoria editorial criada em 1997 no Recife. Já publicou sete livros de poesia e diversos ensaios sobre autores de sua predileção, a exemplo de Guimarães Rosa, Proust e Gilberto Freyre. É organizador da antologia Mauro Mota — Cem crônicas escolhidas, também publicada pela Cepe Editora. Desde 2015, é membro da Academia Pernambucana de Letras.


 

Natanael Lima Jr. - Paulo Gustavo, o seu livro de estreia, Queda para o alto, foi publicado em 1979, pelas Edições Pirata. São 43 anos de vivência literária. Como foi ou como tem sido essa trajetória?

 

 

Paulo Gustavo – Tem sido a que foi possível, considerando nosso contexto socioeconômico ainda tão carente de profissionalismo. De modo geral, penso que tive sorte e conheci as pessoas certas. Retrospectivamente, posso dizer que fui um discípulo dedicado.

 

 

NLJ - Os seus primeiros poemas foram publicados no Suplemento Literário do Diario de Pernambuco, por volta de 1975. O que o motivou a escrever?

 

 

PG – Quando fui publicado por iniciativa do editor César Leal e do professor e padre Romeu Perea, eu vinha de uma prática desde a infância, que depois foi estimulada pelos amigos mais próximos e colegas do Colégio de Aplicação da UFPE. Tenho orgulho (não exatamente vaidade) de dizer que fui “oficialmente” lançado como poeta pelo grande poeta e crítico que foi César Leal, uma vez que ele escreveu um longo texto me apresentando aos leitores e publicando um poema meu, escrito em quartetos assonantados, sobre Frei Caneca.

 

 

NLJVocê conviveu com os poetas das Edições Pirata, bem como da Geração 65. O que representou esses dois movimentos literários pernambucanos na sua trajetória?

 

 

PG – As Edições Pirata, capitaneadas pelos poetas Jaci Bezerra e Alberto da Cunha Melo, da Geração 65, me proporcionaram a alegria dos primeiros livros. Posteriormente, por cursar Letras na UFPE, me aproximei de nomes como José Rodrigues de Paiva, Ângelo Monteiro, Marcus Accioly e do já citado César Leal, mentor daquela geração.

 

 

NLJVocê é autor de uma vigorosa obra literária. Publicou sete livros de poesia e diversos ensaios. Como você se situa na literatura pernambucana atual?

 

 

PG – Pode parecer falsa modéstia, mas não considero que tenha uma “obra vigorosa” como você gentilmente diz. Como me situo? Talvez, conforme escreveu o poeta José Mário Rodrigues, como “o último a tomar o vagão da chamada Geração 65”.

 

 

NLJProvoco frequentemente esse debate: na sua opinião, a literatura serve para quê?

 

 

PG – Como gostava de repetir César Leal, a literatura ocidental é uma instituição que vem da Antiguidade aos dias de hoje. Suspeito que tal permanência no tempo assinala a sua importância e o seu bem à sociedade. A literatura serve para se refletir ou pensar com as graças do sonho.

 

 

NLJ O Brasil respeita seus autores?

 

 

PGEnquanto uma educação inclusiva e de qualidade não se incluir em nosso projeto de nação, sempre haverá pouco respeito por autores, artistas e cientistas. É com educação que se criam plateias, públicos, gostos e, consequentemente, respeito e memória.

 

 

NLJ - O que você acha da crítica literária? Ela ainda existe no Brasil?

 

 

PG – Como se sabe, a crítica literária praticamente refluiu para os guetos universitários. Não haverá nunca boa crítica se ela não conecta a literatura à própria vida, em especial aos leitores. A crítica precisa retomar o gosto pelo ensaio, pelos jornais, pelas revistas. Precisa, pelo menos, flertar com um público mais amplo, indo além dos já convertidos, mas, naturalmente, sem excluí-los.

 

 

NLJNa sua opinião, qual a função social da poesia e do poeta?

 

 

PG – Dizem os teóricos da literatura que essa pergunta importa mais à sociedade que aos poetas. É uma questão de fora para dentro. De qualquer forma, a sociedade tolera o poeta com certa reserva, pois muitos inclusive têm fama de mau comportamento. Se há uma função (por que teria que haver uma “função”?), uma função por assim dizer geral, essa função seria lembrar, ou melhor, fazer valer os direitos inalienáveis da imaginação e da liberdade. Uma sociedade sem imaginação e liberdade está condenada à própria destruição. Hannah Arendt vai ao ponto ao dizer que “Os poetas cunham as palavras pelas quais vivemos”. Bem ela falava de bons poetas, não de versejadores.

 

 

NLJ - Você tem formação em Letras e é Mestre em Teoria da Literatura. Qual a importância do ensino de literatura na formação de leitores e escritores?

 

 

PG – Penso que essa importância é evidente. O ensino incita e excita. O ensino familiariza, torna próximo e, por isso mesmo, provoca admiração e vocações. Mas, por outro lado, sem paixão, apenas mecânico, o ensino também pode ser nocivo e fatal.

 

NLJVocê produz frequentemente conteúdos nas redes sociais e para a revista digital Será? (https://revistasera.info/author/paulo/). Qual a importância dessas plataformas na divulgação da produção literária atual?

 

 

PG – A mídia digital já é indispensável à divulgação literária.

 

 

NLJJoão Guimarães Rosa, Gilberto Freyre e Marcel Proust são autores de sua predileção? Há outros que poderia citar? Qual a importância deles na sua formação literária?

 

 

PG – São vários. Balzac e Melville, por exemplo. E Rilke, Camões, Pessoa, Drummond e Bandeira. Mas, para mim, ao lado de grandes poetas e ficcionistas, com o mesmo peso, também estão filósofos e prosadores como Bertrand Russell, Montaigne, Freud, Wittgenstein, Jules Michelet, Evaldo Coutinho, Todorov e Hannah Arendt, sem falar dos moralistas franceses. O que quero dizer é que, como assinalou José Rodrigues de Paiva, pensadores e narradores têm sobre mim uma influência tão grande quanto os poetas.

 

 

NLJDentro desses 43 anos, o que significou esse O azul também se revolta (Cepe, 2018) em sua obra poética?

 

 

PG – Esse livro, a seu discreto modo, enfeixa, pela primeira vez, alguns poemas sutilmente políticos no sentido amplo do termo, ou sociais. Isso faz com que seja um pouco diferente dos anteriores. A “revolta” busca transcender a pura subjetividade. Mas o crítico Anco Márcio também tem razão em dizer que nele está implícita, em muitas produções, uma “poética do tempo”. Enfim, de certa forma, falando popularmente, acho que tem a ver com chegada da velhice...

 

 

NLJ - Fica aqui o espaço para as suas considerações finais e mensagem aos seguidores do site literário Domingo com poesia.

 

 

PG – Foi uma honra responder à sua entrevista. O Domingo com poesia é, sem favor algum, uma iniciativa louvável. O que vou dizer, nessas considerações finais, citando George Orwell, não é muito animador, mas gostaria de, em parceria com esse grande autor britânico, aliás tão conhecido do público brasileiro, deixar uma mensagem de provocação. Em um dos seus ensaios, Orwell nos diz: “Não há dúvida de que, em nossa civilização, a poesia é, de longe, a mais desacreditada das artes, a única, com efeito, em que o homem comum se recusa a discernir qualquer valor”. Que acham? Oxalá, com a sensibilidade das novas gerações e dos novos poetas, a poesia volte a inspirar o que ela também é: coragem, revelação e fé, e se faça reconhecer como a grande força que move o espírito. Obrigado.




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4 comentários

  1. Parabéns DCP por trazer à cena o poeta Paulo Gustavo . Grande entrevista!

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  2. Parabéns pela maravilhosa entrevista! 👏👏👏

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  3. José Rodrigues de Paiva7 de agosto de 2022 às 11:37

    Parabéns ao DCP pela excelente entrevista realizada com o poeta e ensaísta Paulo Gustavo. Cumprimentos ao poeta pela qualidade das respostas, e os meus agradecimentos pelas referências ao meu nome.

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  4. Maravilha de entrevista. Parabéns!

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