CONTO DO DOMINGO
Concede-me o prazer desta dança?
(conto) de Frederico Spencer
Geraldo
Regaço, nome artístico que usava para brilhar nas noites, fosse nos shows que
fazia ou pelos bares que frequentava, trabalhava feito louco na busca frenética
para firmar seu nome no mercado. Ele era cantor de uma banda de música brega -
sofrência nos dias atuais - tipo de música escolhida a dedo para atender aos
apelos do mercado fonográfico. Vivia intensamente as noites do Recife. Já era
conhecido praticamente em todos os bairros que visitava. Passava as noites em
claro trabalhando exaustivamente, noites essas regadas a muitas doses de rum
com Coca-Cola e também, claro, porque ninguém é de ferro, nos braços
angustiados de algumas fãs carentes, quais suas canções, que nessas horas, eram
cantadas ao pé do ouvido.
Darlene
Costa, mais conhecida por Dadá, era uma mulher compenetrada, visto que, havia
concluído um curso superior sem perder nenhuma cadeira e, na colação de grau
foi homenageada como uma das alunas mais brilhantes. Procurou, assim que se
formou, um concurso público para garantir a sua estabilidade na vida. No
primeiro que fez - pimba! Calma, não é isso que estão pensando - passou em
primeiro lugar, foi uma festa para sua família. Família esta que mesmo sendo
muito religiosa, gostava de uma festinha regada a muita cerveja. Já contando
com o salário que ia receber da repartição pública e, para complementar a festa
que havia começado em casa, foram à Praça do Arsenal de Guerra. Lá estava
ocorrendo um festival de seresta. Pronto, este seria um grande final de noite,
sacramentando as comemorações do futuro provimento do cargo.
Chegando
antes de começar o espetáculo, a família se apossou de três mesas se aprontando
para deliciar-se daquela noite onde haveria a apresentação de vários nomes, uns
consagrados, outros não. O que mais importava no momento era que muitos desses
cantores cantariam sucessos antigos - para alguns recordarem de um tempo que
não volta mais. O romantismo estava solto, no ar sentia-se o perfume, além
daqueles que as damas traziam embotados na pele. A noite ia bombar!
Enfim
música e noite se unem e embalam os corações, uns dançantes, outros prostrados
na cadeira, extasiados que estavam numa hipnose coletiva. De repente uma voz
quase nova toma conta dos quatro cantos da praça, atraindo ainda mais a atenção
de - como já é uma conhecida nossa, podemos chamá-la de Dadá. Era ele o mais
novo sucesso da cidade, ao menos nas rádios comunitárias, Geraldo Regaço foi
impactante. Aí foi pimba mesmo! Amou e terminou casando-se com ele.
Nos
primeiros anos do casamento até que Dadá entendia o porquê da ausência noturna
de Geraldo, mas, uma equação que com o passar do tempo ia ficando cada dia mais
difícil de resolver, batia na sua mente privilegiada: enfim, quando os dois
teriam realmente uma noite para curtir aquele encontro ainda vivo em suas
carnes, que vibravam só de lembrar?
Depois
daquele show trabalhado com muito afinco, por Normando Beira Nova, empresário
da banda, as noites de Geraldo se encheram de trabalho e de distância de Dadá.
Acometida por uma insônia que a maltratava - suada e inquieta na cama - rezava
para os dias amanhecerem.
Um
problemão que ela ainda enfrentava, era quando chegava em casa após o
expediente, encontrava sua cama numa bagunça só - Geraldo com certeza, dormira
mal também o dia, ficara se mexendo de um lado para o outro, procurando o
regaço do corpinho de sua esposa, imaginava ela.
Irritada
com esta situação, Darlene ou Dadá para os mais achegados, resolve queimar o
expediente da tarde. Aproveita a manhã para deixar todo o trabalho pronto e
sair o mais rápido possível da repartição. Correu tanto que antes da hora do
almoço já estava com o pé na rua, a caminho de casa, sonhando com aquele
encontro. Ao chegar ouviu vozes que vinham do quarto, apressou-se e,
sobressaltada invadiu o recinto. Lá estavam Geraldo e Normando, deitados
seminus, conversando alegremente. A
fumaça do cigarro e o cheiro de bebida incensavam o ambiente.
Darlene
nunca desconfiou das vezes que, ao chegar em casa, levando o jantar para ela e
Normando, já o encontrava na porta. Por muitas noites só conversavam, enquanto
a música mais nova de Geraldo rolava na praça.
CONTO DO DOMINGO
Reviewed by Natanael Lima Jr
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08:46
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