TransWinter

Semeador de Sonhos e Esperanças




O poeta sonha para poder viver, para alçar voos, para alimentar sua alma com o mais puro dos alimentos feitos à base de sentimentos, de percepções, de vibrações diante dos acontecimentos da vida. Ser poeta é ter a capacidade de sintetizar e resumir, como disse Fayga Ostrower, “só os poetas podem condensar a experiência humana, e isso não passa pelo intelectual.” Voltaire afirmou, “o esplendor da relva só pode mesmo ser percebido pelo poeta. Os outros pisam nela.” Enfim, a importância de ser poeta é resumida por Edmund Burke, “a poesia é a arte de materializar sombras e de dar existência ao nada.”
Nesta nossa homenagem aos poetas do mundo inteiro, deixo aqui meu caloroso e fraterno abraço aos poetas Cyl Gallindo, Juareiz Correya, Jaci Bezerra, Antonino Oliveira Jr, Ivan Marinho, Jairo Lima, Vera Rocha, Tereza Soares, Doralice Santana, Cobra Cordelista, Miró, José Terra, Almésio Nascimento e os encantados Alberto da Cunha Melo, Celina de Holanda, Luiz Carlos Monteiro, Lula Côrtes, Antonino Oliveira e Paulo Cultura.






Florbela Espanca
 (1894 – 1930)

Ser Poeta

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Áquem e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!




Fernando Pessoa
(1888 – 1935)

Autopsicografia


O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.




Cecília Meireles
(1901 – 1964)


Motivo


Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.




Carlos Drummond de Andrade
(1902 – 1987)

Poema de sete faces


Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! Ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos , raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo,
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.




Manuel Bandeira
(1886 – 1968)

Desencanto


Eu faço versos como quem chora
De desalento... de desencanto...
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente...
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.



E nestes versos de angústia rouca,
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.

- Eu faço versos como quem morre.




Vinicius de Moraes
(1913 – 1980)

O poeta e a rosa


Ao ver uma rosa branca
O poeta disse: Que linda!
Cantarei sua beleza
Como ninguém nunca ainda!

Qual não é sua surpresa
Ao ver, à sua oração
A rosa branca ir ficando
Rubra de indignação.

É que a rosa, além de branca
 (Diga-se isso a bem da rosa...)
Era da espécie mais franca
E da seiva mais raivosa.


- Que foi? – balbucia o poeta
E a rosa; - Calhorda que és!
Pára de olhar para cima!
Mira o que tens a teus pés!

E o poeta vê uma criança
Suja, esquálida, andrajosa
Comendo um torrão da terra
Que dera existência à rosa.

- São milhões! – a rosa berra
Milhões a morrer de fome
E tu, na tua vaidade
Querendo usar do meu nome!...

E num acesso de ira
Arranca as pétalas, lança-as
Fora, como a dar comida
A todas essas crianças.

O poeta baixa a cabeça.
- É aqui que a rosa respira...
Geme o vento. Morre a rosa.
E um passarinho que ouvira

Quietinho toda a disputa
Tira do galho uma reta
E ainda faz um cocozinho
Na cabeça do poeta.




Paulo Alexandre da Silva*
(1953 – 2099)

O Místico


O místico
Entre Deus e o diabo
Causador do teu amor e felicidade
Causador do teu ódio e infelicidade
Ele é como a brisa
Ele é como o furacão
O maior entre os maiores
O menor entre os menores
O Causador do teu sonho
O provocador da tua realidade
O que tu pensaste agora
Ele já pensou antes, muito antes...
A pureza dos seus atos
A exatidão das suas palavras
Leva-te a pensar que ele é louco
Mas, lá no fundo, no fundo...
Da profundidade d’alma
Ele é o teu protetor
Ele é o teu cobertor
Ele é o equilíbrio
Entre o ser e o não ser
Entre o bem e o mal
Entre a tua tristeza e a tua alegria




*Paulo Alexandre da Silva (Paulo Cultura), nasceu em 16 de maio de 1953, na cidade de Rio Largo, Estado de Alagoas. Chegou ao Cabo de Santo Agostinho em 1968, tendo sido um dos mais influentes e atuantes poetas da cidade. Editou conjuntamente com o poeta Natanael Lima Jr, na década de 80, os alternativos poéticos “Para não nos Esquecermos” e o “Só(l) de Versos”, autor do livro de poemas “Ainda batem nossos Corações”.




Ferreira Gullar*

Subversiva


A poesia
quando chega
não respeita nada.
Nem pai nem mãe.
Quando ela chega
de qualquer de seus abismos
desconhece o Estado e a Sociedade Civil
infringe o Código de Águas
relincha
como puta nova         
em frente ao Palácio da Alvorada.
E só depois
reconsidera: beija
nos olhos os que ganham mal
embala no colo
os que têm sede de felicidade
e de justiça
E promete incendiar o país

in NA VERTIGEM DO DIA (1975-1980)

*Ferreira Gullar, nasceu no dia 10 de setembro de 1930, na cidade de São Luiz, capital do Maranhão. Poeta, crítico de arte, biografo, tradutor, ensaísta e um dos fundadores do neoconcretismo.





Thiago de Mello*

Temo por meus olhos


Temo por meus olhos
diante das puras vestes.
E no entretanto, desejo.
Temor que sugere o epílogo
de ser cântaro partido
ao lado de fonte pródiga.
A não contemplar, prefiro
definitiva cegueira.
Não como os homens cegos,
mas como os pés das crianças
que são cegos, caminhando.

*Thiago de Mello, nasceu em 30 de março de 1926, na cidade de Barreirinha, Estado do Amazonas. É um dos poetas mais influentes e respeitados no país, reconhecido como um ícone da literatura regional.




Juareiz Correya*

Discurso poético

“todo poeta é um subversivo”.



Subverto as manhãs com esta violência
de tardes e noites inconsequentes
escangalhando o dia sem contar as horas
faço o tempo pelos ponteiros que perdi
e instituo o levante da minha decadência
não troco a língua nem vendo o nome
decretando entregas e condenando recusas
estandarte de ilusões rasgadas
não canto hinos com estribilhos de amor
por viver inseguro do tamanho de uma pátria
eu me limito à nação que me chamo
e a cada instante república proclamo
contra o império da dor e do abandono
anistio vencedores elejo quem se derrota
livro prisões dos horrores dos homens
marcha nas ruas o exército da minha desordem
e eu abro portas as mãos do regresso


*Juareiz Correya é pernambucano de Palmares. Dirige, no Recife, a Panamérica Nordestal Editora e Produções Culturais.




José Terra*

Pedacinho de mim


Amor, falaste para tuas amigas de macieira
Que o meu amor é calcário e complexo
feito a filosofia.
Só que a filosofia não me dá sossego
(anda agora de mãos dadas com a matemática)
E o meu amor, se o matam hoje,
Torna a brotar quentinho
Na manhã dos desvalidos
Para fazer deles e da flor-de-macieira
uma CANÇÃO DE AMOR


*José Terra é pernambucano de Palmares e radicado em Recife desde 1996. Em 2003, editou, no Recife, conjuntamente com Jorge Ferreira, o fanzine “Hospício Poético – o canto mais lúcido da cidade”. Lançou em 2007, em parceria com o poeta Juareiz Correya, o livro “Poesia do mesmo Sangue”.




Natanael Lima Jr

Profano, quase profeta


Profano

Insano

Marginal

Hominal

Visceral

Atemporal

Cômico

Crônico

Acrônico

Anacrônico

Poeta

Profeta

(poema do livro “À espera do último Girassol & outros poemas)
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