OS ESTATUTOS DO HOMEM DE THIAGO DE MELLO
Por
Natanael Lima Jr.
Thiago
de Mello
nasceu em Barreirinha,
Amazonas, em 30 de março de
1926.
Foto: Divulgação
Atendendo
a pedidos dos nossos seguidores, voltamos a postar o poema mais famoso do poeta
Thiago de Mello: “Os Estatutos do Homem”.
O poema foi escrito em 1964, logo depois do golpe militar. Thiago ocupava
naquela época, o cargo de adido cultural no Chile. Segundo relatos de amigos
próximos, ele renunciou o cargo em reposta ao Ato Institucional número 1 e por
ver a tortura se institucionalizar como método de interrogatório. Essa
indignação resultou em seu poema, certamente, o mais aplaudido.
Thiago
de Mello, é natural do Estado do Amazonas, é tradutor e um dos poetas mais
influentes e respeitados no país, reconhecido como um ícone da literatura
regional. Tem obras traduzidas para mais de trinta idiomas.
OS ESTATUTOS DO HOMEM*
(Ato
Institucional Permanente)
A Carlos Heitor Cony
Artigo I.
Fica decretado
que agora vale a verdade.
que agora vale
a vida,
e que de mãos
dadas,
trabalharemos
todos pela vida verdadeira.
Artigo II.
Fica decretado
que todos os dias da semana,
inclusive as
terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a
converter-se em manhãs de domingo.
Artigo III.
Fica decretado
que, a partir deste instante,
haverá
girassóis em todas as janelas,
que os
girassóis terão direito
a abrir-se
dentro da sombra;
e que as
janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o
verde onde cresce a esperança.
Artigo IV.
Fica decretado
que o homem
não precisará
nunca mais
duvidar do
homem.
Que o homem
confiará no homem
como a
palmeira confia no vento,
como o vento
confia no ar,
como o ar
confia no campo azul do céu.
Parágrafo Único:
O homem
confiará no homem
como um menino
confia em outro menino.
Artigo V.
Fica decretado
que os homens
estão livres
do jugo da mentira.
Nunca mais
será preciso usar
a couraça do
silêncio
nem a armadura
de palavras.
O homem se
sentará à mesa
com seu olhar
limpo
porque a
verdade passará a ser servida
antes da
sobremesa.
Artigo VI.
Fica
estabelecida, durante dez séculos,
a prática
sonhada pelo profeta Isaías,
e o lobo e o
cordeiro pastarão juntos
e a comida de
ambos terá o mesmo gosto de aurora.
Artigo VII.
Por decreto
irrevogável fica estabelecido
o reinado
permanente da justiça e da claridade,
e a alegria
será uma bandeira generosa
para sempre
desfraldada na alma do povo.
Artigo VIII.
Fica decretado
que a maior dor
sempre foi e
será sempre
não poder
dar-se amor a quem se ama
e saber que é
a água
que dá à
planta o milagre da flor.
Artigo IX.
Fica permitido
que o pão de cada dia
tenha no homem
o sinal de seu suor.
Mas que
sobretudo tenha sempre
o quente sabor
da ternura.
Artigo X.
Fica permitido
a qualquer pessoa,
a qualquer
hora da vida,
o uso do traje
branco.
Artigo XI.
Fica
decretado, por definição,
que o homem é
um animal que ama
e que por isso
é belo.
muito mais
belo que a estrela da manhã.
Artigo XII.
Decreta-se que
nada será obrigado nem proibido.
tudo será
permitido,
inclusive
brincar com os rinocerontes
e caminhar
pelas tardes
com uma imensa
begônia na lapela.
Parágrafo único:
Só uma coisa
fica proibida:
amar sem amor.
Artigo XIII.
Fica decretado
que o dinheiro
não poderá
nunca mais comprar
o sol das
manhãs vindouras.
Expulso do
grande baú do medo,
o dinheiro se
transformará em uma espada fraternal
para defender
o direito de cantar
e a festa do
dia que chegou.
Artigo Final.
Fica proibido
o uso da palavra liberdade.
a qual será suprimida
dos dicionários
e do pântano
enganoso das bocas.
A partir deste
instante
a liberdade
será algo vivo e transparente
como um fogo
ou um rio,
e a sua morada
será sempre
o coração do
homem.
Santiago do Chile, abril de 1964
*Publicado no livro Faz Escuro Mas Eu Canto: Porque
a Manhã Vai Chegar (1965).
OS ESTATUTOS DO HOMEM DE THIAGO DE MELLO
Reviewed by Natanael Lima Jr
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02:31
Rating:

Que esse Decreto seja real e irrevogável!💖
ResponderExcluirEstá em nossas mãos. Abç
ExcluirQuem nos dera esse decreto fosse lei!
ResponderExcluirVerdade, quem dera. Abç Lourdinha.
ResponderExcluirGrande é o poeta que chega ao coração de quem lê
ResponderExcluirThiago de Mello é assim. Tive honra de conhecê-lo começo do século, que presença d personalidade
Fausto