III SARAU VIRTUAL
PARTICIPAÇÕES
FLORA
FIGUEIREDO, LAÍS RIBEIRO, MÁRCIA MARACAJÁ, RAIMUNDO DE MORAES E VALMIR JORDÃO
FLORA
FIGUEIREDO (SP)*
“A poesia é minha reserva ecológica,
onde me adentro e respiro fundo. Procuro dividir esse ar puro com quem me lê.
Tenho a sensação de que cada vez que um poeta planta um poema, ele revigora o
planeta. Talvez seja um mero sonho, mas como não sonhar?”
BORBULHANTE
Guardei
meu poema dentro de uma bolha de sabão.
Como
não ficar seduzida
pela
circunferência lisa e transparente,
onde
o arco-íris passeia docemente
e
morre de amores pela espuma colorida?
Acomodado
na nova moradia,
o
poema suspirou e adormeceu.
Quando
acordou, já não mais me pertencia.
A
bolha de sabão se deslocara
e
o poema apaixonado que eu criara
descobriu,
de repente, que era teu.
*Flora
Figueiredo
é natural de São Paulo. Poeta, cronista, tradutora e compositora. Foi vice-presidente da
Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil, membro da Women Association
of Journalists and Writers, correspondente do Centre International d´Études
Poétiques, na Bélgica, de cujo acervo constam suas obras. Durante três anos foi
responsável pela última página da Revista Cláudia. Finalista do Prêmio Jabuti
em 2000 na categoria Poesia, é membro da União Brasileira de escritores (UBE).
A autora publicou as obras poéticas: Florescência (também lançado em Portugal),
Limão Rosa, Amor a Céu Aberto, Estações, O Trem que Traz a Noite, Chão de Vento
e participou de várias Antologias. Seus livros foram adotados pelas redes
públicas de ensino. Tem trabalhos nas áreas publicitária e musical, com
parceiros como Ivan Lins, Natan Marques, maestro Aylton Escobar e vários
outros.
LAÍS
RIBEIRO (PE)
“Poesia é fecundar o lirismo que
transcende os limites lógicos da alma. É olhar, é sentir, é ser em versos, é
estar em cadência e existir na verticalidade sentimental das personas que me
compõe. Ela é para mim assim como sou para vida; existência. Somos um só
organismo e fomos paridas pelo mesmo nó umbilical; vida.”
DISTOPIA
Pátria desolada
Quantos dos teus homens
Hoje são lágrimas?
Esperança sufocada
Queima os olhos
Nação roubada
Liderada pela desordem
E desgraça...
Patriotas monarcas
Quanto ópio...
Partidos democratas
Governam oligarquias
Ironias? Não, mandatos!
Democracia?
Escancara o verbo
No tribunal lotado
Sanguessugas
Pleiteia votos
Dizendo sim
Nonato estado
Governar...
A gente fica de plateia
Vendo o espetáculo
Dos reis que sabem
Roubar...
Votar é fácil
Difícil é aprender
As escolhas mudar
MÁRCIA
MARACAJÁ (PE)
“Um estado de
espírito. Um desdobramento. Uma vazão.
Uma cura. Uma luz.
Um achamento.
Epifania.
Estranhamento.
Ponto de mutação.”
BRADO
SILVÍCOLA
(...)
Cuidado com a Literatura
que não está nos livros
com os artistas que não vão
para a televisão
e que não servem a um patrão
Cuidado com os poetas loucos
Cuidado com os gritos!
Com os famintos e os inquietos!
Com as degradadas
As PUTAS
As libertadas
E os amores invisibilizados
Cuidado, vocês,
que ainda não acordaram
para o sonho da insensatez
para a combustão do pensamento
Acelerado
Inquieto
Utópico
Manifesto
Marginal
Plural
Anárquico?!
Revolucionário?!
Avesso
deste mundo paralelo
Em que
os cegos se refestelam
Em meio
a esta ilusão!!!
ONDE
ÁRVORES SAGRADAS SÃO ARRANCADAS!!!
ONDE
MONSTROS DE CONCRETO SÃO REVERÊNCIAS!!!
ONDE OS
RIOS SÃO ATERRADOS
E A
TERRA É LAVADA EM SANGUE
NEGRO!
BRANCO!
ÍNDIO!
Banhada
em indecências
Onde os
suicídios prosperam!
Onde o
povo é apagado!
Onde a
história é silenciada!
Onde a
beleza existe pra turista ver...
VER O
QUÊ?!
EU TE
DIGO!
EU TE
GRITO !!!
Ver o
sinal da cruz
E ouvir
a oração
A um
Deus que nada pode fazer
Da
ganância e egoísmo desses homens
Dessas
mulheres
Que
fecham os olhos antes mesmo de morrer!
Mortos-vivos!!!
E o
zumbi herói, dele o que se há de fazer?!
A
resistência de seu povo se perde
No
cinturão da pobreza que engrossa
Na
canção e embalo de sua glória que não se dança
Que não
se sabe
Que não
se lembra
Louvamos
a quem?!
Se à
natureza não devotamos amparo
Se não
clamamos todo o nosso legado?
Eu sou
as árvores assassinadas!
Eu sou
as putas apagadas!
Eu
sou as meninas estupradas!
Sou
sangue negro, branco, índio!
Eu sou
corpo, voz e espírito!
(...)
SOU A
TERRA ONDE PISAM OS MEUS PÉS
O
HORIZONTE ONDE MEUS OLHOS PODEM ALCANÇAR
EU SOU
A VOZ QUE ME GRITA OUTROS GRITOS
E SOU
TODO ESTE BRADO SILVÍCOLA!!!
*Poema editado. Parte do texto acima
foi performatizado na 3ª Mostra PE da Produtora Nós Pós, entrando na Chegança
Poética do Literânima, compondo a programação da Praça da Palavra no Festival
de Inverno de Garanhuns (PE), ano 2014.
RAIMUNDO
DE MORAES (PE)
“Usando as palavras
do poeta mexicano Octavio Paz: A poesia revela este mundo: cria outro. A poesia
é uma leitura do mundo real e uma criação de um outro mundo, cuja descoberta
ocorre na interação texto/leitor/contexto.”
SEMENTE*
As
nêsperas na mesa
abrem-se fartas
de
carne e suco
E o violento temporal
vai
dedilhar os poros
revolver pedras
enxaguar
raízes e vermes
afogar
Teu fruto
(eu
lembro) desfibrava fácil
e a carne vinha mole entre os dentes
As
enxurradas vieram
como baladas rápidas de ávidos
curumins
E
os pássaros vieram sujos
de Bering ou Marrakesh
As
águas chegaram. Outra vez, perenes
levando retratos, remexendo sulcos de
discos esquecidos
evolando
perfumes suaves de roupas e camas
Ah por que entre os verões o
manancial da tua boca?
Por que esses perfis de narizes e
lábios
entre o abandono de girassóis que já
não buscam mais?
Por que a frase que tu queres e que
não está em mim?
Pássaros
e chuvas vão e vêm
e redesenharão fantásticos infinitos
enquanto
for grande a imaginação da Esperança
Enquanto não pousarem no único fio
retesado e melódico
E
as fibras desse Verão venham entre os dentes
como reescrevessem c o n t r a p o n
t o s
de
melodias e réquiens
*Poema
do livro Tríade (Facform/Funcultura,
2010)
Prêmio
Carlos Drummond de Andrade Sesc-DF, seleção 2008
VALMIR
JORDÃO (PE)
“A poesia representa para mim, a
beleza,
o respirar a vida na sua plenitude,
o senso crítico e a possibilidade de
registrar
o cotidiano sem participar dos beija
mãos dos sátrapas
e da vassalagem tão antiga e em voga
nos dias atuais.
A poesia é a alma que permeia os
sonhos, as aspirações
e as inquietudes do sentir-se humano,
demasiadamente humano.”
em
minha vida passa um rio
o dossel do rio se rompeu: as
derradeiras baronesas
desprendem-se das úmidas entranhas dos
barrancos.
precavidas, as ninfas já partiram.
doce Capibaribe, corre suave, até que
meu termine.
o rio não suporta garrafas
vazias,restos de comida,
lenços de seda, caixas de papelão,
pontas de cigarros
e diferentes bugigangas em seu dorso,
e outros testemunhos das noites
insones.
os ociosos herdeiros dos magnatas
municipais,
partiram sem deixar vestígios.
às margens do Capiberibe sentei e lá
chorei.
doce Capibaribe, corre suave, pois
falarei
baixinho e quase nada te direi.
atrás de mim, porém numa rajada fria
escuto
o insistente chocalhar de ossos na
Cruz do Patrão,
e um riso ressequido tangencia o rio.
os lúgubres murmúrios da Emparedada da
Rua Nova
ecoam no vento cruzando a terra
estiolada.
o rumor das buzinas e motores não
trarão
a rebeldia da Praieira, nem a
libertária Confederação do Equador.
oh! cidade indomável. as vezes posso
ouvir
em qualquer bar da Mamede Simões,
o álacre lamento de um bandolim,
e a algazarra que farfalha em bocas
tagarelas.
o rio poreja vinhoto e poluição,
as barcaças derivam ao sabor das marés
onde os desportistas ao remo
exercitam-se
sob os arcos das belas e infindáveis
pontes.
e sua correnteza serpenteia a cidade
a convidar para o eterno renascimento.
rio das Capivaras, corre suave
até que meu canto termine.
cão sem plumas , pássaro fênix
a prolongar o nosso desencanto e
alumbramento...
III SARAU VIRTUAL
Reviewed by Natanael Lima Jr
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