POESIA DE MARIA DE LOURDES HORTAS
Por José Luiz Mélo*
Maria de Lourdes Hortas
Foto: Arquivo DCP
Devo lhe chamar assim, lhe define
melhor do que Poeta ou Poetisa.
Isto porque você e os seus versos são de tamanha espiritualidade que não posso imaginá-la gente, à nossa semelhança, nem de matéria, as imagens dos seus poemas que de tão inervadas de sentimento, transcendem ao que estamos habituados que os nossos sentidos percebam e julguem real.
Isto porque você e os seus versos são de tamanha espiritualidade que não posso imaginá-la gente, à nossa semelhança, nem de matéria, as imagens dos seus poemas que de tão inervadas de sentimento, transcendem ao que estamos habituados que os nossos sentidos percebam e julguem real.
Há alguns dias você tem publicado, com
admirável formatação do José Carlos de Abreu, as “Carta à Minha Mãe” nas
páginas do Face. Resgate do seu Livro: “Rumor de Vento”, publicado em 2009 pela
Panamérica Nordestal, do Juarez Correya.
Estas cartas, que nos revelam os
estágios mais elevados a que se pode atingir o espÃrito, humaniza a saudade
tornando-a palpável, sentida, real; traz-nos de volta e eterniza enquanto
perenes e eternos nossos seres que se não apartam porque juntos continuamos
juntos, apenas até você, não sabÃamos como dizê-lo.
Sugiro que estas Cartas sejam
publicadas agrupadas, talvez numa plaqueta, ou numa única postagem no face e em
outras mÃdias, de modo alcançar a todos que procuram um modo de expressar suas
saudades sem conseguir fazê-lo.
Hoje, trazemos “As cartas à minha
Mãe”, para publicação no nosso “Domingo com Poesia”, onde partilhamos com os
nossos amigos o que de mais belo se tem escrito em nossa terra.
*José Luiz de Mélo é poeta e editor do DCP
*José Luiz de Mélo é poeta e editor do DCP
CARTAS
À MINHA MÃE
Aos poucos a hera sobre as pedras
Vira
pedra (...)
WALLACE
STEVENS
Capa
do livro “Rumor de Vento”, publicado
em
2009 pela Panamérica Nordestal
I.
Quando
quase menina, comecei a
escrever
eras sempre a primeira
leitora.
Se
gostavas, dizias: “Fiquei arrepiada. Isso
é
bom!” Se não gostavas, o arrepio não
vinha.
Aconselhavas-me:
“tenta outra vez...”
Depois
que partiste, Mãe, naquele
agosto
cinza, A poesia calou-se dentro
de
mim.
Hoje
ocorreu-me a causa do meu silêncio:
tanta
coisa para te dizer e não consigo...
Certamente
por conta da ausência do
barômetro,
teu arrepio.
Por
isso resolvi escrever estas cartas:
quem
sabe assim conseguirei demolir o
silêncio
que vem aprisionando o meu
coração?
Minha
querida Mãe,
Quando
receberes esta, de onde
estiveres,
como te for possÃvel por
favor
envia-me um sinal de que a carta
chegou.
Pode
vir numa sonata de
chuva
na visita de beija-
flor
no arrepio de
vento...
II.
Minha
alma regressa esta
noite:
Seu retorno dói.
Dou-me
conta de que
não
sou de pedra.
À
noite o silêncio da casa parece
levedar
como crescia a massa do
pão
sob dobras de linho nos
mistérios
da infância.
Mal
escurece pressinto teus
passos
riscando o corredor.
O
coração acelera-se
prelúdio
na penumbra da
sala
dissonância no piano
ausente.
IV.
No sonho
ultrapasso o
portal secreto.
Meus dedos
resvalam pela
seda lilás do teu
vestido.
V.
Esta
madrugada liguei
para
ti: Chamou,
chamou
e ninguém
atendeu.
De
repente veio a
chuva
dialogar na
vidraça.
Do retrato
VI.
antigo escapou o
teu sorriso.
VII.
Agora
que dormes sob a
pirâmide
no vértice do
tempo
sabes o
que
diz o vento
quando
passa
assobiando
pela estrada.
VIII.
Na
casa onde vivias
murcharam
as violetas
todavia
chuvas e
ventos
ainda
conversam
na varanda
onde
rezavas voltada
para
o mar.
O
quarteto de pássaros
teus
amigos visitantes
pontuais
pela madrugada
e
ao entardecer não
entenderam
porque
emudeceu
tua presença
azul
alumiando o sol.
IX.
O
rio da tua
vida
passou a
ser
meu
afluente
enquanto
rio eu
for.
X.
Depois
de mim
quem
colherá tuas
águas?
XI.
A
porta da tua
casa
cerrou-se
para
sempre
quando
fecharam
a
porta
da caixa
onde
apenas
coube
teu
corpo
frio.
XII.
...livro
aberto na
mesinha
de
cabeceira
porta-
jóias
caixa de
música
xÃcara sobre
a
mesa vidro de
perfume
anel
retrato
vestido
sobre
a cama
coisas
tantos e
tantos
signos da
engrenagem
da
vida
gestos
expostos
emoções
Ã
deriva espalhados
XIII.
na
pressa da
partida.
XIV.
Inviolável
cofre tua vida
tornou-se
ontem para
sempre.
ImpossÃvel
reverter
a rocha lava
fria.
XV.
Agora
tua casa
se
entrelaça nas
casas
daqueles
que
ainda por
aqui
se demoram
mais
um pouco.
No
retrato antigo sorris e
esperas:
é véspera, Mãe.
XVI.
Quando
te cobriram
com
a mortalha de
terra
a vida pesou
sobre
mim, órfã.
XVII.
Um
portal se
fecha
a tristeza
me
cobre: crepe
negro
e molhado
terra
soterrando o
cofre
que te
enterra.
XIX.
Implacável
eclipse o
da
morte
transformando
em
bronze
a que viaja
mares
de terra a
dentro.
A
ressonância do
pranto
não atinge o
biombo
que te
oculta.
XX.
Menina
adormecida
dentro
do barco
sonhas
com a eira
ao
relento do luar.
Para
essa geografia
viajas
ao encontro
dos
que vivem na
aquarela
antiga.
XXII.
Ficaram
teus recados
inscritos
na tarde
lilás
de um agosto de
chuva.
Fábulas
cifradas
nas folhas
de
chá depostas na
porcelana
fria.
POESIA DE MARIA DE LOURDES HORTAS
Reviewed by Natanael Lima Jr
on
05:00
Rating:

"Ficaram teus recados
ResponderExcluirinscritos na tarde
lilás de um agosto de
chuva. Fábulas
cifradas nas folhas
de chá depostas na
porcelana fria."
Parabéns! Belas conexões de palavras.
Muita emoção e uma suave chuva molham meus olhos cansados... o perfume tem a cor lilás.
ResponderExcluirBelissima, Maria
Adorei a tua poesia sobre a MÃE. Bjs.
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