ENTREVISTA COM A EDITORA SALETE RÊGO BARROS
Salete R. Barros/Foto:divulgação
“O leitor
pernambucano deve ser mais exigente, no que diz respeito à valorização dos
autores da terra, abolindo de vez o chamado “complexo da casa-grande”,
instituído desde a colonização”.
A
editora Salete Rêgo Barros concede entrevista inédita ao DCP e fala sobre
literatura, sua experiência como editora e o atual mercado editorial
pernambucano, sobre as atividades que desenvolve na Cultura Nordestina Letras
& Artes, além de outros temas ligados a cultura pernambucana.
Salete
Rêgo Barros é escritora, editora da Novoestilo Edições do Autor e Produtora
Cultural Executiva da Cultura Nordestina Letras & Artes. Nascida no
interior pernambucano em 23 de novembro de 1952, no seio de uma família que
cultivava as letras e as artes. Concluiu sua graduação em Arquitetura pela
Universidade Federal de Pernambuco em 1977, passando, em seguida, a exercer a
profissão. No entanto, em poucos anos optava por cuidar dos três filhos em tempo
integral. Em 1995, iniciou-se como editora da Novoestilo Edições do Autor
incentivada pela poetisa e escritora Ivanete Rêgo Barros, sua mãe, propondo-se,
pioneiramente, em Pernambuco, a democratizar a arte literária através de
pequenas tiragens, oferecendo aos autores a possibilidade de publicar os seus
escritos de forma racional e ecologicamente correta, atividade que lhe
proporcionou a oportunidade de desenvolver ações voltadas para a preservação e
o resgate da cultura pernambucana.
DCP
– Como
foi seu primeiro contato com a literatura?
SRB
- Foi
desde sempre. Em casa, tínhamos uma biblioteca razoável e eu sempre recebia
livros nos aniversários, no Natal, quando minha mãe chegava de viagem e quando
meu tio vinha nos visitar. A literatura e o rádio eram as únicas janelas que eu
tinha para enxergar o mundo que me encantava. A cena que não posso esquecer foi
quando recebi, pelos Correios, uma caixa contendo vários livros – resultado de
minha participação no sorteio da Rádio Clube de Pernambuco, para onde enviei
uma embalagem do sabonete Gessy com a resposta, escrita de próprio punho, à
pergunta: Qual o sabonete preferido pelas estrelas do cinema? Meus avós,
achando que alguns daqueles livros não eram indicados para uma criança ler,
cortaram em pedacinhos os de autoria de Jorge Amado, transformando parte de minha
primeira conquista literária em um amontoado de papel picado.
DCP
– O
que a motivou ser editora?
SRB
– O
insignificante percentual que minha mãe recebeu de uma grande editora sediada
em São Paulo, pela publicação de 8.500 exemplares de um infantojuvenil de sua
autoria, lançado em todo o Brasil. O valor recebido, que se transformou em um
lanche que nós duas fizemos na Confeitaria Confiança, na Rua da Imperatriz, no
centro do Recife, motivou a minha decisão de editar e imprimir os outros livros
dela. Deu certo. Surgia em Pernambuco, em 1995, um “novo estilo” de edições
independentes, o das pequenas tiragens, de forma ecológica e economicamente
correta.
DCP
– Como
você analisa o atual mercado editorial pernambucano?
SRB
- Ainda
temos grandes desafios a enfrentar, entre eles: a qualidade das edições e a
preferência por títulos de autores estrangeiros e de outras regiões do Brasil.
O leitor pernambucano deve ser mais exigente, no que diz respeito à valorização
dos autores da terra, abolindo de vez o chamado “complexo da casa-grande”,
instituído desde a colonização. Um exemplo concreto é o fato de a obra de
Raimundo Carrero ser mais conhecida fora, do que dentro de seu próprio berço e,
ao ser convidado para ministrar oficinas de criação literária em outros países
e estados brasileiros, ser muitas vezes mais bem remunerado do que é em
Pernambuco.
DCP
- A
Cultura Nordestina Letras & Artes promove regularmente oficinas e cursos
para formação de novos escritores. Qual a importância deste trabalho?
SRB
- A
capacitação é fundamental para o exercício de qualquer atividade. O escritor
não necessita, apenas, de inspiração e criatividade. Mais que isso: ele precisa
da independência, que se dá através do conhecimento e da técnica. Para que ele
entre e permaneça no mercado editorial, é indispensável que se atualize e
domine a língua portuguesa em todo o seu dinamismo; que conheça técnicas de
criação literária e a história da literatura através dos tempos; que desenvolva
sua criatividade, também, através do exercício da escrita de textos
dissertativos; que conviva com escritores mais experientes, entre outras coisas
que o habilitarão a transmitir a sua narrativa de forma adequada.
DCP
– Como
produtora e ativista cultural, qual a sua opinião sobre as políticas públicas
desenvolvidas em Pernambuco?
SRB
- Pernambuco
tem, reconhecidamente, um mercado promissor no que diz respeito à sua
multiplicidade cultural. No entanto, para que se torne possível a concretização
das produções, produtores e artistas precisam, cada vez mais, de capacitação
para poder captar recursos, além do convencimento necessário para que empresas
e cidadãos invistam mais em cultura através dos incentivos fiscais. No caso
específico da literatura vejo, com pesar, que a verba destinada às produções literárias
está muito aquém da sua importância para a preservação das nossas raízes
culturais. Observo, também, que a meritocracia é substituída por interesses
menores (leia-se particulares), quando se trata da aprovação de projetos. O
fato subtrai da sociedade o direito assegurado pelo artigo 215 da Constituição,
que prevê: O Estado garantirá a todos o
pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes de cultura nacional,
e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.
Afinal, o contribuinte renuncia a mais de um terço de seu salário, em forma de
impostos, que deveriam ser revertidos para a sociedade, de maneira equilibrada.
DCP
- O
DCP tem priorizado a divulgação da produção literária de Pernambuco. Como você
analisa este trabalho?
SRB
- O
trabalho que o DCP vem realizando é de importância fundamental para difundir a
literatura produzida em Pernambuco, no Brasil e no mundo. As ferramentas que
possibilitam essa divulgação (nunca antes imaginada) estão sendo utilizadas com
competência pela equipe do portal, e o reconhecimento do fato se reflete
através do número de acessos à página, da conquista, pelo segundo ano
consecutivo, do prêmio Top Blog Brasil, do perfil das pessoas que acessam o
DCP: estudantes, pesquisadores, professores, etc. Um fator relevante nesse tipo
de divulgação é o incentivo à leitura – responsável pela formação de cidadãos
capazes de se posicionar criticamente perante a sociedade. Empresas que apoiam
a iniciativa, certamente, só terão a lucrar, pois associam as suas marcas a um
projeto que privilegia o que existe de mais precioso para a preservação das
raízes de um povo: a sua produção literária.
Agradeço,
sensibilizada, a Natanael Lima Júnior e a Frederico Spencer, a oportunidade de
participar do DCP, como colaboradora, e de poder, através desta entrevista,
registrar o meu pensamento esperando contribuir, de alguma forma, para
despertar a consciência dos que podem mudar a forma como a literatura vem sendo
tratada pelas políticas públicas.
ENTREVISTA COM A EDITORA SALETE RÊGO BARROS
Reviewed by Natanael Lima Jr
on
10:05
Rating:
.png)
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluir