SETEMBRO DE POESIA
Organização
e seleção Natanael Lima Jr.
Publicado
em 06/09/2020 às 00:01
Montagem/arte:
DCP
O site DCP traz nesta edição uma seleção de 10 poemas de
autores nascidos no mês de setembro, dentre eles: La Gitanilla, de Miguel de Cervantes - romancista,
dramaturgo e poeta castelhano, nascido em 29 de setembro de 1547; Soneto (Des)pejado, de Bogage - poeta português, considerado o maior representante do
arcadismo lusitano, nascido em 15 de setembro de 1765; Soneto, de Natividade Saldanha - advogado,
poeta, músico e ativista brasileiro, nasceu em Santo Amaro do Jaboatão dos
Guararapes, PE., em 8 de setembro de 1796; Adeus
meus sonhos, de Álvares de Azevedo - escritor da segunda geração romântica,
contista, dramaturgo, ensaísta e poeta, nasceu em São Paulo no dia 12 de
setembro de 1831; Parasitas, de Guerra
Junqueiro - jornalista, escritor e poeta português, nasceu em 15 de
setembro de 1850; Manhã à Janela, de
T.
S. Eliot – poeta, dramaturgo e crítico de língua inglesa, considerado
um dos mais importantes do modernismo literário, recebeu o Prêmio Nobel de
Literatura de 1948, nasceu em 26 de setembro de 1888, San Luis, Missouri, EUA; Fado português, de José Régio - pseudônimo
de José Maria dos Reis Pereira, poeta português, dramaturgo, romancista,
novelista, contista, ensaísta, cronista e crítico, nasceu em 17 de setembro de
1901, Vila do Conde, Portugal; Meu povo,
meu poema, de Ferreira Gullar, pseudônimo de José Ribamar Ferreira, poeta,
crítico de arte, biógrafo, tradutor, memorialista e ensaísta, um dos fundadores
do neoconcretismo brasileiro, nasceu em 10 de setembro de 1930, São Luís,
Maranhão; Recital, de Juareiz
Correya - poeta, contista e editor, na década de 70, residiu em São
Paulo, onde foi colunista de arte do Diário do Grande ABC (Santo André, SP),
nasceu em Palmares, PE., em 19 de setembro de 1951; Estamos sob o mesmo teto, de Arnaldo Antunes - poeta, músico,
compositor e artista visual, nasceu em São Paulo, em 2 de setembro
de 1960.
POEMAS ESCOLHIDOS
Miguel de Cervantes
(1547
– 1616)
LA GITANILLA
Cuando
Preciosa el panderete toca,
y
hiere el dulce son los aires vanos,
perlas
son que derrama con las manos,
flores
son que despide de su boca.
Suspensa
el alma y la cordura loca
queda
a los dulces actos sobrehumanos,
que
de limpios, de honestos y de sanos
su
fama al cielo levantado toca.
Colgados
del menor de sus cabellos
mil
almas lleva, y a sus plantas tiene
Amor
rendidas una y otra flecha:
ciega
y alumbra con sus soles bellos,
su
imperio Amor por ellos se mantiene,
y
aun más grandezas de su ser sospecha.
Bocage
(1765
– 1805)
SONETO
(DES)PEJADO
Num cappote embrulhado, ao pé de Armia,
Que tinha perto a mãe o cha fazendo,
Na linda mão lhe foi (oh céus) mettendo
O meu caralho, que de amor fervia:
Entre o susto, entre o pejo a moça ardia;
E eu solapado os beijos remordendo,
Pela fisga da saia a mão crescendo
A chamada sacana lhe fazia:
Entra a vir-se a menina... Ah! que vergonha!
"Que tens?" — lhe diz a mãe
sobresaltada:
Não pode ella encobrir na mão langonha:
Suffocada ficou, a mãe corada:
Finda a partida, e mais do que medonha
A noite começou da bofetada.
Natividade Saldanha
(1796 – 1830)
SONETO
Se no seio da pátria carinhosa,
Onde sempre é fagueira a sorte dura,
Inda lembras, e lembras com ternura,
Os meigos dias da união ditosa ;
Se entre os doces encantos de que goza
Teu peito divinal, tua alma pura
Suspiras por um triste e sem ventura,
Que vive em solidão cruel, penosa ;
Se lamentas com mágoa a minha sorte,
Recebe estes meus ais, oh minha amante,
Talvez núncios fiéis da minha morte.
E se mais nós não virmos, e eu distante
Sofrer da parca dura o férreo corte:
Amou-me, dize então, morreu constante.
Ávares de Azevedo
(1831 – 1852)
ADEUS, MEUS SONHOS!
Adeus, meus sonhos, eu pranteio e morro!
Não levo da existência uma saudade!
E tanta vida que meu peito enchia
Morreu na minha triste mocidade!
Misérrimo! Votei meus pobres dias
À sina doida de um amor sem fruto,
E minh’alma na treva agora dorme
Como um olhar que a morte envolve em luto.
Que me resta, meu Deus? Morra comigo
A estrela de meus cândidos amores,
Já não vejo no meu peito morto
Um punhado sequer de murchas flores!
Guerra Junqueiro
(1850 – 1923)
PARASITAS
No meio duma feira, uns poucos de palhaços
Andavam a mostrar, em cima dum jumento
Um aborto infeliz, sem mãos, sem pés, sem
braços,
Aborto que lhes dava um grande rendimento.
Os magros histriões, hipócritas, devassos,
Exploravam assim a flor do sentimento,
E o monstro arregalava os grandes olhos
baços,
Uns olhos sem calor e sem entendimento.
E toda a gente deu esmola aos tais ciganos:
Deram esmola até mendigos quase nus.
E eu, ao ver este quadro, apóstolos romanos,
Eu lembrei-me de vós, funâmbulos da Cruz,
Que andais pelo universo há mil e tantos
anos,
Exibindo, explorando o corpo de Jesus.
T. S. Eliot
(1888 – 1965)
MANHÃ À JANELA*
Há um tinir de louças de café
Nas cozinhas que os porões abrigam,
E ao longo das bordas pisoteadas da rua
Penso nas almas úmidas das domésticas
Brotando melancólicas nos portões das áreas
de serviço.
As ondas castanhas da neblina me arremessam
Retorcidas faces do fundo da rua,
E arrancam de uma passante com saias
enlameadas
Um sorriso sem destino que no ar vacila
E se dissipa rente ao nível dos telhados.
*Tradução: Ivan Junqueira
José Régio
(1901 – 1969)
FADO PORTUGUÊS
O Fado nasceu um dia,
quando o vento mal bulia
e o céu o mar prolongava,
na amurada dum veleiro,
no peito dum marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.
Ai, que lindeza tamanha,
meu chão, meu monte, meu vale,
de folhas, flores, frutas de oiro,
vê se vês terras de Espanha,
areias de Portugal,
olhar ceguinho de choro.
Na boca dum marinheiro
do frágil barco veleiro,
morrendo a canção magoada,
diz o pungir dos desejos
do lábio a queimar de beijos
que beija o ar, e mais nada,
que beija o ar, e mais nada.
Mãe, adeus. Adeus, Maria.
Guarda bem no teu sentido
que aqui te faço uma jura:
que ou te levo à sacristia,
ou foi Deus que foi servido
dar-me no mar sepultura.
Ora eis que embora outro dia,
quando o vento nem bulia
e o céu o mar prolongava,
à proa de outro veleiro
velava outro marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.
Ferreira Gullar
(1930 – 2016)
MEU POVO, MEU POEMA
Meu povo e meu poema crescem juntos
como cresce no fruto
a árvore nova
No povo meu poema vai nascendo
como no canavial
nasce verde o açúcar
No povo meu poema está maduro
como o sol
na garganta do futuro
Meu povo em meu poema
se reflete
como a espiga se funde em terra fértil
Ao povo seu poema aqui devolvo
menos como quem canta
do que planta
Juareiz Correya
(1951 - )
RECITAL*
1: Um
Nem interessa mais figurar minha fantasia de
mim.
eu sou sem retoques, sem adornos
e bilheterias para o espetáculo
estas poucas coisas que me desacertam
e harmonizam meu sangue com bombas
no coração do mundo.
me vejo pior a cada dia separados dos outros
por isto que lhes dedico.
desejo apenas compor com todos uma alegria
que sequestre todos os temores e uma entrega
que não nos devolva a este tempo, jamais.
gritar nas ruas as novas promessas da gente,
dizer um manifesto que revolucione e anule
[a ordem
que vocês estabeleceram para calar suas
vidas.
para esse carnaval eu não escondo nada,
[não subtraio
minhas energias nem evito qualquer janeiro
para esse carnaval eu vou invadir as ruas
ser a pele dos batuques, o pano da troça
o sexo da folia,
desembestando multidões,
no pulo dos passos, bêbado de cantar
*In
Americanto Amar América e Outros Poemas do Século 20
Arnaldo Antunes
(1960 - )
ESTAMOS SOB O MESMO TETO
estamos sob o mesmo teto
secreto
onde o sol indesejável é barrado
eu e você
sob o mesmo nós
dois, sóis
sob o mesmo pôr
(o enigma do amor)
do sol
onde todo contorno finda
estamos
sob a mesma pálpebra
agora
já e ainda
intactos de aurora.
SETEMBRO DE POESIA
Reviewed by Natanael Lima Jr
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00:01
Rating:
Sempre será ótimo um Domingo com Poesia. Parabéns, Natanael.
ResponderExcluirMuito obg amigo Ramos Sobrinho pela sua visita. Compartilhe nosso site, abç
ExcluirPoeta Amigo e Editor Natanael Lima Jr.:
ResponderExcluirMuito agradeço a sua generosa seleção do meu nome e de um poema que publiquei ("Americanto Amar América", Nordestal, Recife, 1982) e a exposição em um grupo de Grandes Poetas/Grandes Poemas. Uma exagerada exposição deste pequeno poeta e do seu muito menor poema junto a gigantes da Poesia do Brasil, Espanha, Portugal e Estados Unidos. Seu trabalho é louvável e você merece ser aplaudido em tudo o que faz. Gosto de aplaudir tudo o que vale a pena. Mas, sinceramente, não gosto de ser aplaudido. Guarde o meu abraço fraterno para os dias melhores que viveremos.
Juareiz Correya
Sim : Compartilhei esta postagem do DOMINGO COM POESIA na minha página e com 10 grupos (4 do Recife, 5 de Palmares e 1 de São Paulo) do FACEBOOK. Também divulguei no Twitter e no LinkedIn.
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