Os bons ventos de maio trouxeram muitas
alegrias. Alcançamos a marca de mais de 10 mil acessos, em pouco mais de 10
meses de postagem do blog domingo com poesia, um espaço criado exclusivamente
para a literatura e a poesia. Partilhamos esta conquista com os nossos
colaboradores, amigos e leitores espalhados pelo estado de Pernambuco, em
diversas cidades brasileiras e agora em alguns países, como Chile, Cuba, El
Salvador, Argentina, Nicarágua, Portugal, Espanha, Alemanha e Holanda.
Esperamos que novos ventos cheguem e
tragam muitas oportunidades, realizações e alegrias. E que a poesia continue
iluminando e perfumando nossos caminhos.
Esta atualização dedicamos as mães e
aos poetas Ascenso Ferreira, Carlos Pena Filho e Paulo Alexandre da Silva
(Paulo Cultura).
Natanael Lima Jr
Editor
Ascenso
Ferreira
(1895 – 1965)
Ascenso Carneiro Gonçalves Ferreira
nasceu no município de Palmares, zona da Mata de Pernambuco, a 09 de maio de
1895, filho único do comerciante Antônio Carneiro Torres e da professora Maria
Luiza Gonçalves Ferreira. Órfão aos 13 anos de idade passa a trabalhar na
mercearia de um tio e, em 1911, publica no jornal A Notícia de Palmares, o seu
primeiro poema, "Flor Fenecida". Em 1920, muda-se para o Recife, onde
se torna funcionário público e passa a colaborar com o Diário de Pernambuco e
outros jornais.
Em 1925, participa do Movimento
Modernista de Pernambuco e, em 1927, publica seu primeiro livro,
"Catimbó", que segundo Mário de Andrade, um dos livros mais originais
do Modernismo Brasileiro. Publicou ainda os livros de poesia “Cana Caiana”
(1939) e “Xenhenhém” (1951). Sua poesia reunida foi publicada no livro “Poemas”
(edição especial em 1951 e uma edição popular em 1953). O poeta faleceu no
Recife, no dia 05 de maio de 1965.
POEMAS DE ASCENSO FERREIRA
A rua do rio
(Palmares)
No
começo da rua
Morava Agostinho - o aleijado -
A quem o povo acusava de alimentar-se de coisas imundas:
- Bichos mortos apanhados nos fundos dos quintais!
Fronteiro a ele morava o pedreiro Manuel Belo,
Que por ter sido mordido de cachorro da moléstia,
Quando falava com a gente avançava como um cão!
No meio da rua morava a celebérrima preta Inês,
Catimbozeira "afamanada",
Sempre às voltas com sapos e urubus!
Na outra ponta da rua morava a mulata Filomena,
A quem um jacaré acuou dentro de um banheiro no rio,
E que saiu nuinha pela estrada afora,
Gritando: "Me acudam! Me acudam!"
Morava Agostinho - o aleijado -
A quem o povo acusava de alimentar-se de coisas imundas:
- Bichos mortos apanhados nos fundos dos quintais!
Fronteiro a ele morava o pedreiro Manuel Belo,
Que por ter sido mordido de cachorro da moléstia,
Quando falava com a gente avançava como um cão!
No meio da rua morava a celebérrima preta Inês,
Catimbozeira "afamanada",
Sempre às voltas com sapos e urubus!
Na outra ponta da rua morava a mulata Filomena,
A quem um jacaré acuou dentro de um banheiro no rio,
E que saiu nuinha pela estrada afora,
Gritando: "Me acudam! Me acudam!"
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Mas nem tudo na Rua do Rio,
Era infâmia, nojo, abominação!
Na outra ponta da rua,
Bem nos fundos do quintal da casa de minha mãe,
Morava o fogueteiro Lulu Higino,
Que no silêncio das noites consteladas,
Arrancava da flauta uns acordes tão suaves,
Que até parecia serem as estrelas lá no céu
Que estavam tocando...
Era infâmia, nojo, abominação!
Na outra ponta da rua,
Bem nos fundos do quintal da casa de minha mãe,
Morava o fogueteiro Lulu Higino,
Que no silêncio das noites consteladas,
Arrancava da flauta uns acordes tão suaves,
Que até parecia serem as estrelas lá no céu
Que estavam tocando...
(Transcrito do livro “Xenhenhém”, Recife, 1951)
Noturno
Sozinho
nas ruas desertas
do velho Recife
que atrás do arruado
moderno ficou...
criança de novo
eu sinto que sou:
— Que diabo tu vieste fazer aqui, Ascenso?
O rio soturno,
tremendo de frio,
com os dentes batendo
nas pedras do cais,
tomado de susto
sem poder falar..
o rio tem coisas
para me contar:
— Corrre senão o Pai-do-Poço te pega, condenado!
Das casas fechadas
e mal-assombradas
com as caras tisnadas
que o incêndio queimou
pelas janelas esburacadas
eu sinto, tremendo,
que um olho de fogo
medonho me olho:
– Olha que o Papa-Figo te agarra, desgraçado!
Dos brutos guindastes
de vultos enormes
ainda maiores
nessa escuridão...
os braços de ferro,
pesados e longos,
parece quererem
suster-me no chão!
Ai! Eu tenho medo dos guindastes,
Por causa daquele bicão!
Sozinho, de noite,
nas ruas desertas
do velho Recife
que atrás do arruado
moderno ficou...
criança de novo
eu sinto que sou:
— Larga de ser vagabundo, Ascenso!
Carlos
Pena Filho
(1928
– 1960)
Carlos Souto Pena Filho, poeta
pernambucano, nasceu no Recife no dia 17 de maio de 1928. Seu pai era o
comerciante português Carlos Souto Pena e sua mãe D. Laurinda Souto Pena.
Publicou
O Tempo da Busca, em
1952; Memórias do Boi
Serapião, com ilustrações de Aloísio Magalhães, edição Gráfico
Amador, Recife, 1956;
A Vertigem Lúcida, edição da Secretaria de Educação e Cultura de
Pernambuco, 1958 e Livro
Geral, edição da Livraria São José, 1959.
A obra de Carlos Pena Filho revela sentimento de
delicadeza e cuidado para não ofender as pessoas e as ideias. Ele era conhecido
pelos amigos, como sendo uma pessoa muito comunicativa, sorridente, cordial,
tolerante e compreensiva. Naturalmente, muito dessas características eram
passadas para sua obra.
Sua última poesia, Eco, foi publicada no Jornal
do Commercio, no domingo, véspera de sua morte trágica.
No
dia 2 de junho de 1960, o poeta estava no carro de seu amigo, o advogado José
Francisco de Moura Cavalcanti, quando foram atingidos por um ônibus
desgovernado. Carlos Pena recebeu uma violenta pancada na cabeça, mas o poeta
não resistiu aos ferimentos e morreu no dia 10 de junho de 1960.
Fonte:
Fundação Joaquim Nabuco
POEMAS DE CARLOS PENA FILHO
O chope
Na Avenida Guararapes,
O Recife vai marchando.
O bairro de Santo Antônio,
Tanto se foi transformando
Que, agora, às cinco da tarde
Mais se assemelha a um festim,
O refrão tem sido assim: são trinta copos de chope,
São trinta homens sentados,
Trezentos desejos presos,
Trinta mil sonhos frustrados.
Para fazer um soneto*
Tome um pouco de azul, se a tarde é clara,
e espere pelo instante ocasional.
Nesse curto intervalo Deus prepara
e lhe oferta a palavra inicial.
Aí, adote uma atitude avara:
se você preferir a cor local,
não use mais que o sol de sua cara
e um pedaço de fundo de quintal.
Se não, procure a cinza e essa vagueza
das lembranças da infância, e não se apresse.
Antes, deixe levá-lo a correnteza.
Mas ao chegar ao ponto em que se tece
dentro da escuridão a vã certeza,
ponha tudo de lado e então comece.
Tome um pouco de azul, se a tarde é clara,
e espere pelo instante ocasional.
Nesse curto intervalo Deus prepara
e lhe oferta a palavra inicial.
Aí, adote uma atitude avara:
se você preferir a cor local,
não use mais que o sol de sua cara
e um pedaço de fundo de quintal.
Se não, procure a cinza e essa vagueza
das lembranças da infância, e não se apresse.
Antes, deixe levá-lo a correnteza.
Mas ao chegar ao ponto em que se tece
dentro da escuridão a vã certeza,
ponha tudo de lado e então comece.
*do Livro
Geral
Paulo
Alexandre da Silva
(Paulo Cultura)
(1953 – 2009)
Paulo
Alexandre da Silva nasceu no município de Rio Largo – AL, em 16 de maio de 1953
e chega ao Cabo de Santo Agostinho em 1968. Foi professor da Rede Municipal e
Funcionário Público da Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho. Foi membro da última diretoria do Grêmio
Literário Cabense (1972) e participou do Grêmio Cultural e Esportivo Cabense
(GRECUEC). Fundador e Editor dos Alternativos Poéticos “Para não nos
Esquecermos” (1984) e “SÓ(l) de Versos” (1985 a 1992). Autor do livro de poesia
“Ainda Batem Nossos Corações” (1985) e participou da I Antologia de Escritores
e Poetas Cabenses (2001). Acometido de uma enfermidade degenerativa o poeta vem
a falecer em 21 de julho de 2009. É um dos Patronos da Academia Cabense de
Letras.
Paulo Alexandre da Silva era detentor de uma palavra
vigorosa e despojada de qualquer retórica formal, rançosa e altissonante: a
palavra que nomeia, a palavra que traduz, a palavra que semeia – estas foram a
munição do poeta.
Foi um poeta engajado, adaptava sua ação às suas ideias,
e o fazia cotidianamente. Ele sempre encarou a poesia como meio de expressão
legítima de suas crenças humanísticas, sociais, filosóficas e políticas.
Sua poesia se concentra basicamente em três linhas:
nos poemas de temática social, nos de feição lírica e existencial.
A variedade temática que ele abordou na sua intensa
produção poética multifacetada, não significou dispersão, mas domínio seguro de
um fazer poético que de poema para poema se adensa e se refina. Paulo Alexandre
da Silva tem, assim, a singularidade, entre todos os poetas novos do Brasil.
POEMAS DE PAULO ALEXANDRE DA SILVA
(Paulo Cultura)
O místico
O
místico
Entre
Deus e o diabo
Causador
do teu amor e felicidade
Causador
do teu ódio e infelicidade
Ele
é como a brisa
Ele
é como o furacão
O
maior entre os maiores
O
menor entre os menores
O
Causador do teu sonho
O
provocador da tua realidade
O
que tu pensaste agora
Ele
já pensou antes, muito antes...
A
pureza dos seus atos
A
exatidão das suas palavras
Leva-te
a pensar que ele é louco
Mas,
lá no fundo, no fundo...
Da
profundidade d’alma
Ele
é o teu protetor
Ele
é o teu cobertor
Ele
é o equilíbrio
Entre
o ser e o não ser
Entre
o bem e o mal
Entre
a tua tristeza e a tua alegria
Algo mais
Há
n’alma do poeta algo
Algo
de transcendental e impassível
Há
uma luz que reluz todas as luzes
Há
n’alma do poeta
A
dor de todas as dores
O
desespero de todos os desesperados
Há
n’alma do poeta
O
amor de todos que amam
A
felicidade dos felizes
A
alegria dos contentados
Há
n’alma do poeta
O
sonho do sonhador
A
angústia dos angustiados
Há
n’alma do poeta
O
culto à natureza que a tudo inspira
Há
n’alma do poeta
O
fluxo e o refluxo do mar
A
coerência de todas as coerências
A
vontade louca de amar...
Algo mais que o poeta não
alcança.
Reviewed by Natanael Lima Jr
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