ENTREVISTA COM O ESCRITOR SIDNEY NICÉAS
Postado por DCP
em 19|06|2022
*Entrevista concedida ao editor do site Natanael Lima Jr.
Sidney Nicéas é escritor e tem cinco obras publicadas. Colunista
de Literatura das Rádios CBN e Transamérica e criador e editor do Blog
Tesão Literário, preside a Ideação, co-realizadora da
Bienal Internacional do Livro de Pernambuco. Prepara dois romances para breve,
um biográfico e outro de ficção.
Professor
universitário, também é Relações Públicas com MBA em
Gestão de Pessoas, Pós-Graduando em Escrita Criativa e titular da própria
assessoria de comunicação, a Sidney Nicéas Comunicação Integrada.
Ainda integra os projetos sociais Sertânia Sem Fome e Mundo do
Lua, além de promover diversas ações que visam a inclusão social pela
Literatura.
DOMINGO COM
POESIA – Quem é Sidney Nicéas?
SIDNEY
NICÉAS - Só um enxerido no universo das letras, tentando depurar
todos os incômodos desse lodo humano, inclusive e especialmente o que o habita.
Mas, no fim das contas, um lutador pelo que acredita: a arte que impulsiona o
espírito humano e promove, de fato, transformações reais. É uma luta que vale
uma vida.
DCP – Você é escritor, colunista de literatura, preside a Ideação
(co-realizadora da Bienal Internacional do Livro de Pernambuco), participa de
oficinas, promove lives, palestras, produz conteúdos na web, promove diversas ações de inclusão social e ainda tem uma
assessoria de comunicação. Como você consegue conciliar tudo isso?
SN - Não
sei. Juro. Trabalho 10, 12 horas por dia, incluindo muitas vezes meus finais de
semana, intercalando sempre com a deliciosa missão de pai da minha filhinha
Maya, de 03 anos. A necessidade de (sobre)viver e o tesão pelas coisas e
pessoas que valem a pena são meu combustível. O que me salva (e não é demagogia
minha) é a escrita, a leitura, meus filhos e as relações amorosas que construí
e construo em minha vida.
DCP – Você é autor de poucos livros. Mas, como todos sabem, a
qualidade não se mede pela quantidade. Sidney Nicéas escreveu até agora,
digamos, o necessário?
SN - Longe
disso. Tenho obras que não publiquei e nem vou publicar, escritos de gaveta,
como se chama, importantes pro desenvolvimento como escritor. Comecei a
escrever por enxerimento, até que fui mordido de vez pelo poder da literatura.
Sou inquieto e vivo experimentando técnicas. Estudar, escrever, ler, dar aulas…
tudo isso foi me fazendo ampliar, e muito, o olhar para o fazer literário. A
cada livro escrito sinto que cresço de alguma maneira, como escritor e ser
humano. E constato que vou morrer insatisfeito com o que conseguirei fazer até
a hora de ir. Mas acho que essa angústia não é exclusividade minha. O bom é
aprender a brincar com esse ofício num país broxante - tem que ter muito Tesão
Literário, e eu tenho!
DCP – Vamos falar aqui de escritores e de literatura: como você
avalia a produção literária hoje no estado?
SN - Acho
que nos falta base. Não temos formação adequada e somos salvos por mestres como
Raimundo Carrero e Paulo Caldas, com suas oficinas fixas - e por nomes como
Sidney Rocha que vez por outra trazem oficinas sazonais, eu também. Hoje também
temos duas pós-graduações em Escrita Criativa no Recife, mas isso ainda é
pouco. Mesmo assim, acho que o nosso momento é bom, tem muita gente de
qualidade escrevendo e publicando em Pernambuco. Todavia, não dá pra falar de
produção literária sem chiar com a nossa pobre cadeia local do livro, com
poucas editoras sérias e menos livrarias ainda, com poucas políticas públicas
sérias e parcos eventos literários (e os que existem sangram para acontecer).
Ando inquieto com a passividade com que nós, escritores e atores da cadeia do
livro, vimos aceitando isso tudo. Num Estado marcado pela insurreição, é
preciso agir. Estou seriamente apoiado nisso nos últimos tempos.
DCP – E a sua produção literária? Como você se situa na literatura
pernambucana atual?
SN - Na
verdade não faço esse tipo de análise, meu trabalho é escrever. Nesse sentido,
posso garantir que estou mergulhado em processos criativos. Estou há seis anos
sem publicar livro, estudando e escrevendo bastante, exercitando muito -
inclusive tenho um romance biográfico que deverá sair no segundo semestre,
outro de contos que pode sair ainda este ano e um romance de ficção que vou
reescrever. Nesse período fiz uma pós-graduação em Escrita Criativa pela
FAFIRE, que me foi importante (estou só aguardando o diploma). Se disso tudo
sair prêmio, algum tipo de reconhecimento ou simplesmente nada, continuarei
pautando a minha escrita no que acredito, não em premiações. Não há outro modo
de seguir.
DCP – O Brasil respeita seus autores?
SN - O
Brasil não respeita seus autores, nem seus artistas, nem sua cultura. O povo
brasileiro carece de “tutano”. Temos uma “elite” tão pobre quanto a pobreza da
maioria. Há um glamour atribuído aos escritores, mas quem está na labuta sabe o
quanto teve e tem que suar pra conseguir o mínimo. Não temos uma cultura de
arte, não presenteamos as pessoas com livros, por exemplo. Falta comida pro
corpo e pra alma. E ainda tem gente pregando o armamento da população… Esse
país é uma piada de mal gosto.
DCP – Provoco frequentemente este debate: a literatura serve para
quê?
SN - Enquanto
produção e consumo literários, serve para a mente e para a alma (não vou falar
aqui da literatura em seu universo clássico-doutrinário). Sou uma vítima feliz
da literatura. Sem ela estaria perdido.
DCP – O que você acha da crítica literária? A crítica literária ainda
existe no Brasil?
SN - Tudo
mudou, isso também: a crítica literária, antes dividida entre seu pedantismo e
necessidade, foi relegada em tempos em que todo mundo tem e divulga sua
opinião. Mas tem gente boa ainda. O problema é que não há mais canais de massa
para fazê-los aparecer, já que literatura não dá like.
DCP – Como você avalia a realização de concursos e prêmios literários
nacionais?
SN - Os
prêmios são importantes para o escritor por darem visibilidade e algum
dinheiro, mas estão longe de ser parâmetro para um aval definitivo de
qualidade. Quem escreve pensando em prêmio está perdendo o melhor do fazer
literário.
DCP – Você já realizou diversas oficinas de escrita criativa nas
escolas, não é isso? Que balanço você faria do nível de interesse pela leitura
e a escrita dos alunos?
SN - Faço
workshops em escolas, mas já promovi várias oficinas para jovens. Promovo
outras para públicos de baixa renda e ou em situação de vulnerabilidade.
Também, nas oficinas pagas, seja para qual faixa etária for, abro cotas sociais
para quem não pode pagar. Numa dessas oficinas, um aluno cotista me procurou
preocupado. Era a penúltima aula e ele lamentava pelo fim, afinal, voltaria
para sua rotina onde nenhum dos seus amigos lia ou escrevia. Vou conversar
sobre esses assuntos com quem, professor? Ele me questionava e eu sentia como
um murro na minha barriga. Como podemos admitir isso passivamente? Não aceito
viver num país onde pessoas são privadas de alimento, pro corpo e pra alma.
Precisamos mudar isso. Sem base jamais seremos uma nação de verdade. Falta ação
e acredito que nós, escritores, podemos ser agentes, ao menos, para plantar
boas sementes. É o que venho tentando fazer. Não dá pra desistir.
DCP – Você produz frequentemente conteúdos na web, especialmente para
o seu blog “Tesão Literário”. Qual a importância dos blogs e sites literários?
SN - Acho
que a relevância está no acreditar, em não desistir, em mostrar que, yes, nós
temos literatura. O Tesão Literário se ampara na qualidade do pensar, do
escrever e do ler. Temos colunistas em vários pontos do país, e fora também,
todos unidos por esse elo. Aqui em Pernambuco, iniciativas como o DCP e
o Angústia Criadora, por exemplo, bebem da mesma fonte e acabam sendo
instrumentos importantes para quem gosta de ler e escrever. Repito: não dá pra
desistir.
DCP – Você atualmente preside a Ideação, co-realizadora da Bienal
Internacional do Livro de Pernambuco. Você consegue mensurar o tamanho desse
desafio?
SN - Eu
tento fazer como Madre Tereza de Calcutá: quando perguntada como conseguia
atender tanta gente num único dia, dizia que olhava somente para o próximo à
sua frente, para não sentir algum desestímulo pelo tamanho da fila (e da
tarefa). Não dá pra ficar olhando o tamanho do desafio. Minha angústia é não
conseguirmos realizar nem metade do que sonhamos, por falta de apoio mesmo -
nosso país não ajuda. O bom é que a turma de Rogério Robalinho é coesa e focada
nos mesmos objetivos meus: é possível fazer, mesmo com todas as dificuldades; é
possível impactar outras vidas pelo universo do livro; é indispensável manter a
força, mesmo com tanta correnteza contra.
DCP – Você está preparando dois romances: um biográfico e outro de
ficção. Você poderia falar mais um pouco sobre esses livros?
SN - Vou
contar melhor essa história que adiantei mais acima. Em 2016, quando lancei
Noite em Clara, iniciei a escrita de outra narrativa de ficção (cheguei a
finalizá-la um tempo depois, mas deixei o projeto de lado e tive muitas ideias
que me farão reescrever o livro em breve). Foi então que recebi o desafio de
escrever uma biografia. Começou a jornada de Todos os Amores de Lourdes, a
história de Lourdes Alencar, uma recifense que foi estuprada pelo próprio pai
dos 07 aos 12 anos de idade e que hoje, com 72 anos, após uma vida flertando
com a miséria humana, tem 13 filhos, sendo 10 adotivos, uns no papel e outros
que acolheu mesmo já sendo registrados (e ainda outros tantos que ajudou
sobremaneira - tem até membro de gangue que hoje é empresário bem sucedido).
Uma narrativa obrigatória pela quantidade de temas relevantes, com pautas ainda
muito atuais. Após seis anos de trabalho, estamos atualmente no processo de
revisão e devemos lançar no segundo semestre deste ano. Daí, há uns três meses
comecei a fazer uns experimentos de escrita que estão resultando numa série de
contos curtos. Provavelmente resulte num livro, talvez até em parceria com uma
escritora amiga. Como não dá pra dar spoiler, em breve poderei falar mais sobre
isso.
DCP - Fica aqui o espaço para as suas considerações finais e mensagem
aos seguidores do site literário “Domingo com Poesia”.
SN - Continuemos
a ler e questionar a realidade. Pensar nunca foi tão necessário. Acho que nunca
vivemos tempos tão rasos, com tamanha reverberação do banal. Todos os
efeitos-manada que percebemos bebem na mesma fonte da falta de pensamento
crítico. É preciso sair das bolhas criadas pelas redes sociais e das
perpetuações de narrativas enganosas ou limitadas. Poucas vezes na história da
humanidade fomos instados a ser mais como agora. Por isso precisamos lutar pela
arte, pela cultura, pela educação, pela democracia, pelo direito a uma espécie
de equidade. Precisamos de mais amor e menos violência e isso só se consegue
agindo - amor também é ação. Temos capacidade e conhecimento hoje para
questionar o que nos ensinaram sobre Deus, sobre o universo, sobre a vida,
sobre as religiões, sobre fatos históricos, sobre o nosso país, sobre nós
mesmos, e ressignificar tudo isso. Amar ao próximo como a nós mesmos nunca foi
tão necessário - e isso nada tem a ver com religião.

Excelente entrevista. Parabéns para o escritor Sidney Nicéas e para o DCP
ResponderExcluirFoi uma grande entrevista. Agradeço seu comentário.
ExcluirBela entrevista, parabéns!
ResponderExcluirO DCP parece que veio pronto para guerra neste final de semana - três guerreiros, cada um dentro de suas batalhas, lutando pela sobrevivência da literatura. Ainda bem que eles existem para o bem de todos nós. Parabéns ao editor pela excelente reunião dessas cabeças pensantes, precisamos muito neste momento tão difícil.
ResponderExcluirRealmente uma rica seleção. Três grandes guerreiros da literatura.
ExcluirConheci o poeta, Sidney Nicéa, no - Poleiro da minha casa. Conduzido pelo Colombiano, Carlos Siena, genro de Dora, de Sertânia City, minha querida e saudosa contrrrânea. Não tivemos tempo de socializarmos ideias. O Carlos, está "desaparecido". Sinto a sua falta. Devo dizer que acompanho o Necéa, oportunamente, nos intervalos literários. Todavia, devo dizer que senti firmeza no escritor pelas suas características, longe das etiquetas Acadêmicas e distante dos Acadêmicos carimbados, ansiosos para que um dia sejam transformados em mais um boógrafo de funerária. Entendo também que Necéa, come os dias literários da sua profissão, sem sinais de "panca de Valente"! O Poeta, de Sertânia, Josessandro Andrade caçador de talentos, tem nos dado informações desse escritor, de maneira séria e responsável. Isso é bom e necessário! O bastante, para divulgar o nome de quem faz literatura com respansabilidade, simples, feito uma rolinha chumbada, como deveria ser. Salve! Salve!
ResponderExcluiresio rafael. Falando sobre Necéa. Para não esquecer meu próprio nome. "Coisas da nossa língua Portuguesa"!
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