AS FACES DO AZUL NA POESIA DE CARLOS PENA FILHO
Imagem: Reprodução
Por Frederico Spencer
No “blues” – estilo musical criado
pelos negros que trabalhavam como escravos nas fazendas dos Estados Unidos, a
“blue note” marca e define como gênero essas canções, advindas dos cânticos de
saudade da terra e da amada que ficaram no além mar.
Além de dar o compasso do andamento da
música, a “blue notes” cria o ambiente nostálgico e triste dessas canções. No
caso da poesia urbana, em alguns poetas, conseguimos identificar estes
vestígios; a solidão dos grandes centros tecida na fragilidade das relações
humanas, impostas por um modo de vida: o vazio, decantado no ritmo sincopado de
seus versos.
Na poesia do poeta do azul, Carlos
Pena Filho, podemos identificar as várias faces desta solidão e de seus ritmos,
como fosse música: a “blue note”, que nos serpenteia o dia a dia. Escolhi
alguns sonetos tentando mostrar estas faces:
TRÊS POEMAS DE CARLOS PENA FILHO
FAZENDA NOVA*
É
como se fossem ruínas,
mas
não de muros ou casas.
São
ruínas de terra antiga
que
o tempo estraga.
Vistas
de longe, essas pedras
de
irregulares tamanhos
são
lembranças renascidas
de
abandonados rebanhos.
Mas,
quando vistas de perto,
a
ideia que a gente faz
é
a de que aquilo é somente
lavoura
de Satanás.
Apenas
o sol se move
nessa
paisagem sem bois,
sem
cabras e sem ovelhas,
sem
antes e sem depois.
Ainda
mais duas coisas
pode
esse campo lembrar:
um
cemitério sem corpos
ou
um leito de mar, sem mar.
SONETO PARA O
DEDO ANULAR*
Inúteis
as ausências prometidas
e
os cães de lodo resguardando a praça,
seremos
sempre estátuas de fumaça
plantadas
sobre o chão das avenidas.
Eternamente
a olhar pra trás pendidos
como
galgos do céu ali tombados,
murmuraremos
pedras e recados
que
nunca chegarão para os ouvidos.
Viveremos
de avanço e retrocesso
e,
quando nos sentirmos desmanchados
dentro
de nossos corpos pelo excesso,
comporemos
silêncios entre as frias
manhãs,
onde veremos espantados
que
inventamos um tempo além dos dias.
SONETO*
O
quanto perco em luz conquisto em sombra
e
é de recusa ao sol que me sustento.
Às
estrelas prefiro o que se esconde
nos
crepúsculos graves dos conventos.
Humildemente
envolvo-me na sombra
que
veste, à noite, os cegos monumentos
isolados
nas praças esquecidas
e
vazios de luz e movimento.
Não
sei se entendes: em teus olhos nasce
a
noite côncava e profunda, enquanto
clara
manhã revive em tua face.
Daí
amar teus olhos mais que o corpo
com
esse escuro e amargo desespero
com
que haverei de amar depois de morto.
*Poemas
extraídos do Livro Geral
AS FACES DO AZUL NA POESIA DE CARLOS PENA FILHO
Reviewed by Natanael Lima Jr
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05:00
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