O Discurso e sua Prática - Questões Históricas
Frederico Spencer*
O uso da palavra como forma de vencer
contendas aparece pela primeira vez na Grécia antiga quando os sofistas começam
a passar seus ensinamentos para os jovens da aristocracia grega preparando-os
para o uso da oratória, como forma de persuadir pessoas. O maior interesse
destes jovens pela oratória dava-se em detrimento da política.
Com o surgimento das cidades, a
palavra adquire um valor incalculável para as novas relações de poder que ali
se estabeleciam, tornando-se um instrumento poderoso para a formação do
discurso ideológico. A manutenção das elites no poder passa a depender do bom
uso da palavra. A chegada da nova ordem pedia eloquência verbal como condição
primordial para o homem poder ocupar posição na nova estrutura social.
A vida social e as relações entre os
homens, com o aparecimento das cidades, passam a ter um desenho diferente onde,
nem as guerras nem as contendas particulares, de forma isolada não definiam
relações de poder, mas, também a arte de influenciar pessoas tinha seu peso.
A nova linguagem passa a moldar o
pensamento do homem que surge a partir da criação da urbanização como modo de
vida. A fixação da nova ordem social e econômica impõe novas relações de poder
e prestígio, a política surge como meio de equalização das forças sociais que
ali surgiam.
Era nas ágoras da Grécia antiga onde o
povo se reunia e discutia a solução dos problemas que envolvia a vida de todos.
A democracia exigia a prática da oratória como forma de instrumento para se
vencer uma guerra, a guerra da persuasão, do convencimento em prol de uma causa
particular.
No mundo moderno a linguagem
desempenha um papel primordial para a fixação e crescimento do homem no meio
social, pois, ela constrói relações de ordem cultural que forma o modo pelo
qual uma sociedade pensa, fala e interage. O desenvolvimento das cidades e de
suas estruturas impõe a todos os cidadãos uma maior especificação no trato com
a arte da fala e de sua expressão.
Porém, é na área da política onde se
dá sua maior especificidade pois, o conteúdo da informação tem como plano levar
para um número maior de pessoas as mensagens dos grupos de poder, impondo a
todas as pessoas os traços culturais destes grupos como modelos de
comportamento e de visão de mundo. Neste sentido cria-se um processo de
aculturação, impondo às classes mais vulneráveis padrões e formas de
pensamento, alinhados com o modelo ideológico vigente.
A produção artística nas sociedades
vem de encontro a este processo quebrando sua hegemonia, pois a linguagem das
artes rompe com a padronização do pensamento coloquial que transforma o homem
em máquina de produção. Buscando o símbolo, não como referência, mas como
partida, abre novos espaços na mente humana onde estão depositados seu
humanismo e sua vontade de sonhar, de enxergar-se além da vida cotidiana.
O homem é o único animal que
desenvolveu a capacidade de ver o resultado de suas ações presumindo seu
futuro, seu mundo cultural diante da exuberância da natureza que o rodeia e o
eleva à categoria de humano, regada aos discursos ideológicos que permeiam a estrutura
de poder e pressão.
Desta forma, o grande Nietzsche nos
deixou o seguinte pensamento: “Temos a necessidade da arte, mas só precisamos
de uma parte do saber”. Debrucemo-nos então sobre esse pensamento para vivermos
modernamente.
*Frederico Spencer é poeta, sociólogo e psicopedagogo
POEMAS DE NATANAEL LIMA JR, JUAREIZ CORREYA E
ANTONIO DE CAMPOS
Epitáfio à
canção perdida*
Natanael
Lima Jr
Pode
bem ser a última canção.
Que
mais importa?
agora
que me encontro sozinho
na
avenida vazia dos meus sonhos
sem
amigos e irmãos
sem
pai e mãe
nada
mais importa
a
canção está perdida
não
desejo mais ouvi-la.
Canto
desprovido de vida sonora
desmaterializado
de poesia
e
melodia.
Talvez
um dia
possamos
unir nosso canto
numa
única canção pela paz fraternal.
Que
mais importa?
agora
a canção jaz morta
e
permanece pra sempre
a
lembrança da última canção.
Nada
mais importa
a
canção está perdida
e
o canto se arrefece.
*do Livro “À
espera do último girassol & outros poemas”
Poesia, mulher
e vinho*
Juareiz
Correya
“A mulher, a música e o vinho
São as minhas paixões.”
(Franz Schubert)
Não
é paixão a poesia
-
é a verdade e a vida.
a
mulher não é paixão
- é o meu outro corpo
minha outra alma
meu outro coração.
não é paixão o vinho
- é o meu sangue,
palavra ardente,
rubra canção.
*Coração
Portátil – Ebook publicado pela Emooby Pubooteca, de Portugal, 2010.
Ébrios, melhor
suportaremos a eternidade
Antonio
de Campos
Bailemos,
dancemos e cantemos
como os
pássaros –
indiferentes
a tudo,
exceto
à alegria!
O farol
do sol
e o
espelho da lua
brilham
sem fim.
O
primeiro nos faz clarão
a novo
encontro,
o
segundo nos emudece
as pupilas
ao verde.
Os
deuses nos lançam os dias,
nada
mais.
Anda!
Vamos!
bebamos
o vinho do breve sonho,
ébrios,
melhor suportaremos a eternidade!
À terra o que é da terra
Paulo Azevedo Chaves*

O dia se iniciara como qualquer outro. Preguiça de
sair da cama; pássaros piando no jardim lá fora.Cumpriu as tarefas de lavar o
rosto, escovar os dentes, colocar as duas próteses dentárias nas respectivas
arcadas, fazer a barba. Tudo como de costume. O café da manhã também foi
parecido com o de outros dias: nescafé com adoçante, torrada com queijo
derretido, algumas bolachas com margarina Delícia. Tudo como de praxe, um
verdadeiro ritual.
Mas o que se segue foi diferente dos dias
anteriores. Em vez de se vestir para o trabalho chato de tradutor na fábrica,
vestiu lentamente os trajes pré-selecionados na noite anterior. Faltava
escolher o sapato e as meias. Pretos, tudo preto como convinha. Pegou o
portarretrato de Rodrigo, seu querido (e marginal) secretário, que estava sobre
o console da saleta onde assistia TV na SKY. Deu um beijo no vidro frio, fez
nova declaração de amor à imagem sorridente do morto. Em seguida, foi ao quarto
e olhou-se no espelho da penteadeira para ver se estava com boa aparência, os
cabelos ralos bem penteados.Tudo OK.
O tempo passara rápido. Muito sexo e alguns amores.
Encontros aqui e ali – Recife, Rio, São Paulo, Londres, Paris, Nova Iorque.
Aquele bar em Greenwhich Village, Nova Iorque, era realmente divertido. Música
nas alturas e uma fauna variada de gays no entorno… Era jovem, então – tinha
vinte e poucos anos, a idade da desrazão, parafraseando Sartre e o livro
que lera um dia em algum lugar: A Idade da Razão. Mas que importa tudo
isso agora? Foi até a cozinha e arrastou com alguma dificuldade o bujão
(afinal, estava com 74 anos) até a saleta . Espargiu um pouco de perfume no ar
para disfarçar o cheiro desagradável de gás no ambiente. Fechou com gestos
lentos a porta de entrada. Acomodou-se na poltrona tipo espreguiçadeira e
apertou contra o peito o portarretrato. O exit era triste e solitário como
havia sido sua própria vida. Fechou os olhos e ficou quieto pensando no imenso
desperdício que tinham sido todos aqueles anos de mudos diálogos consigo mesmo.
Já sonolento, pensou em Shakespeare : ”A vida é uma história contada por um
idiota, cheia de som e fúria, sem significado algum.” E apagou.
*Paulo Azevedo Chaves é poeta, tradutor, escritor, jornalista e crítico de arte.
O Discurso e sua Prática - Questões Históricas
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