“10 POETAS ESSENCIAIS DA LITERATURA PERNAMBUCANA” – Parte III
Publicado
por DCP em 07/02/2021
Nesta postagem
divulgamos o último grupo de poetas citados pelos entrevistados na ‘enquete’
realizada e organizada pelo site DCP,
“10 POETAS ESSENCIAIS DA LITERATURA
PERNAMBUCANA”. Participam neste grupo os poetas: Maria de Lourdes Hortas, Marcus
Accioly, Cida Pedrosa, Janice Japiassu e Miró. Agradecemos a participação e a colaboração de todos. Boa
leitura e até lá.
Natanael
Lima Jr.
Editor-Fundador do
Site
POEMAS
DE MARIA DE LOURDES HORTAS, MARCUS ACCIOLY, CIDA PEDROSA, JANICE JAPIASSU E
MIRÓ
FIO DE LÃ*
Maria
de Lourdes Hortas
Quando
no Tejo embarquei
tinha
um xalinho pra frio
que
os mares de sete dias
desmancharam
em novelo.
Aqui
achei outro rio
e
de Bandeira roubei
o
primeiro “alumbramento”.
Desbotaram
os rosados
de
minha face europeia:
amorenei,
inteirinha.
De
menina, virei moça.
Troquei
o falar castiço
por
sotaque tropical
arrastado
e mestiço.
(Se
esqueci das amoras?
Das
quintas e das latadas,
das
fontes, grilos, giestas,
primaveras
e outonos?)
Passei
a colher pitombas,
jambos,
mangas, carambolas,
e
me entreguei à passagem,
às
praias, coqueiros, pontes.
Mas
a ponta inicial
daquele
fio de lã
(azul
e quente da infância)
ficou por certo amarrada
do
outro lado.
Fixa
por limos do tempo
ainda
existe, raiz,
e
insiste em meu canto.
Só
isso não consegui
ao
passar o Equador:
de
minha alma-guitarra
fazer
um clarim-metal.
Insisto,
a culpa é da lã.
Aquele
fio azulado,
que
reteve o meu cantar
longe,
longe, do outro lado.
Por
ele caminham ondas
de
atavismo irrecusável
(lírica
voz portuguesa).
E
em minhas cantigas - todas
por
mais que busque alegria
choro
fado concerteza.
*(in
Fio de Lã, Gabinete Português de Leitura de Pernambuco, 1979)
A PEDRA
LAVRADA*
Marcus
Accioly
1
- A mão que lavra a pedra
A
pedra a mão esgota,
No
chão de pedra o grão
De
pedra em pedra brota.
A
mão sacode o grão
No
chão de pedra morta,
De
pedra em pedra o grão
Da
própria pedra brota.
2
- A mão fecunda a pedra
Nos
ossos do seu ventre,
O
grão nasce do chão
Da
pedra em seu ventre.
A
mão conhece o chão
Onde
desceu por entre
O
grão que vem da pedra
Aberta,
do seu ventre.
3
- Se a chuva molha não
O
grão na pedra, ovo
No
ninho, pedra aberta
Que
se fecha de novo.
A
mão que sabe o grão
Que
falta à mão do povo,
Espera
o sol, a ave,
Que
choca o grão, o ovo.
4
- O sol, ave-de-fogo,
Não
queima o grão que choca,
Porém
nascido ao sol
O
grão já nasce soca.
Mas,
sim ou não, o grão
Da
pedra se desloca
Chocado
pelo chão
Depois
que a mão o choca.
5
- O grão não sabe o chão
Por
isso a mão prepara
O
grão para viver
Na
pedra que escancara.
Se
mesmo farto o grão
A
safra é sempre avara,
Na
pedra, o grão em flor
E
fruto se escancara.
(...)
Poema
integrante da série A Pedra Lavrada -
Canto I
In:
ACCIOLY, Marcus. Nordestinados. 2.ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro;
Brasília: INL, 1978. p.17-18. (Tempoesia, 18)
NOTA:
Poema composto de 20 oitava
SOLO PARA
VIALEJO*
(Fragmento)
Cida
Pedrosa
(...)
antes
de os homens brancos chegarem com suas
naus
nauseabundas e nulas a terra era vasta e nós
vivíamos
livres
livres
e vastos
livres
e vastos
livres
e vastos
não
éramos vestais
éramos
a vida o verbo e a vastidão
o
verbo a voz e a vastidão
o
verbo
o
verbo
o
verbo
sem
necessidade de deus
*Solo
para Vialejo
escrito pela poeta pernambucana Cida Pedrosa e publicado pela Companhia Editora
de Pernambuco (Cepe) em 2019. O livro, de 128 páginas, conta com um único poema
com moldes que remetem aos épicos. A história, desenvolvida de forma
fragmentada e baseada fortemente nas memórias da autora, faz referência à
diáspora de negros, índios e pessoas oprimidas que saíram do litoral de
Pernambuco em direção ao sertão, tendo como foco principal Bodocó, cidade natal
de Cida. Há ainda uma associação entre a música sertaneja e o blues, além de
descrições de clima, fauna, flora, geografia, cheiros, sabores e outras referências
íntimas da autora. Em 2020, o livro foi premiado no 62º Prêmio Jabuti nas
categorias "Poesia" e "Livro do Ano", esta última destinada
ao livro que teve a maior pontuação dos jurados considerando todas as
categorias, tanto de ficção quanto de não ficção.
O
DISCURSO E O DESERTO
Janice Japiassu
Com o acre mel do deserto
De ouro veste-se o nome
Pronunciado na guerra.
O sol fecunda as espadas
Retesa o arco certeiro
E o sete nasce da pedra
No silêncio alumioso
Da noite mal-assombrada
Mistura o grito viçoso
Eis a palavra afiada
Nos pastos da solidão
Dentro do silêncio limpo
Voz de toda precisão
O
SAL DO SOL*
Miró
Certos estranhos
pedaços de ruas
habitaram meu olhar
a solidão sentada
no colo das vovós
novelo de linha
traçando o tempo
veloz das esquinas
um dia eu fui menino
“e muito louco”
levei trinta e três palmadas
por soletrar sol
em vez de sal
*(in:
Quem descobriu o azul anil, 1985)

Mais uma seleção “naipe de ouro “ - como costuma dizer a poeta Vernaide Wanderley! Bravo!
ResponderExcluirQue bom seu comentário e visita ao site. "Naipe de ouro"
ExcluirMais uma seleção “naipe de ouro “ - como costuma dizer a poeta Vernaide Wanderley! Bravo!
ResponderExcluirO DISCURSO E O DESERTO
ResponderExcluir(Janice Japiassu)
Brilhante poema, metafórico grito do Eu poético!
PEDRA LAVRADA*
ResponderExcluirMarcus Accioly
1 - A mão que lavra a pedra
A pedra a mão esgota,
No chão de pedra o grão
De pedra em pedra brota.
Forte, envolvente, pedra talhada no âmago da poesia!
Salve, salve Marcus Accioly
Aqui achei outro rio
ResponderExcluire de Bandeira roubei
o primeiro “alumbramento”.
Singeleza da descoberta, um alumbramento poético, uma alma linda nos versos de Maria de Lourdes Hortas!