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ZIZO E IVAN MAIA – FRENTE A FRENTE

 

Postado por DCP em 20/02/2022


[Curadoria de Valmir Jordão]








Zizo e Ivan Maia I Arte: DCP









No final dos anos 70 e começo dos anos 80, conheci o poeta Zizo nos recitais da rua 7 de Setembro e no Beco da Fome na Boa Vista. No Centro de Artes e Comunicação da UFPE participamos dos inúmeros saraus improvisados na hora, fora da programação e sem a mínima logística ou apoio oficialesco, metíamos os peitos, pois o mundo era um grande soutien. Afora os lançamentos dos amigos e dos poetas que tocavam os nossos corações como o Alberto da Cunha Melo, o Jaci Bezerra, a Lucila Nogueira, o Wilson Araújo de Souza, Juareiz Correya, Marcelo Mário Melo, entre outros.

 

No início dos anos 90, houve uma grande efervescência poética, teatral e anárquica no Espaço de Cultura Libertária na rua Fernandes Vieira, sob o comando do poeta Ivan Maia e do poeta Carlos Cardoso e  da poetisa Marta Braga na Sopa Caraíba do Bar Antropófago, além da participação do nosso vizinho ilustre Jommard Muniz de Brito, a atriz Cláudia Harmes, que recitava a "Puta" do poeta Carlos Drummond de Andrade e os poemas de sua autoria, os poetas Erickson Luna, Francisco Espinhara, Jorge Lopes, Samuca Santos, Fred Caminha, Heloísa Bandeira, Lara,  Acionildo,  Eunápio Mário, Ivan Marinho, SR Tuppan, Humberto Felipe, Joca de Oliveira, Osvaldo César, Fernando Chile,  Ângelo Bueno, Lu Bezerra, Lindomar,  Wilson Vieira, Zizo, Miró da Muribeca, França de Olinda entre outros.

 

E o projeto "Poesia na Praça" que foi criado pelo poeta Ivan Maia com a participação e performances de vários poetas aos domingos nas praças do centro e das periferias do Recife que foi um sucesso total sem nenhum apoio institucional ou político, fazíamos na raça e na vontade. Neste período tivemos também contatos com o psicanalista Roberto Freire, o criador da Somaterapia e seus seguidores, mas isso são outros quinhentos.

 

Frente a frente,  Zizo e Ivan Maia, dois poetas, dois olhares poéticos, dois irmãos de estradas e suas buscas no "Carpe Diem"... 

 

Valmir Jordão¹






Zizo é o poeta que inspirou o cineasta Cláudio Assis a criar o personagem Zizo, interpretado por Irandir Santos no filme A Febre do Rato. É poeta recifense nascido no Zumbi em 1949 e começou a publicar nos fazines em 1975 os seus desenhos e poemas. Trabalhou no Jornal da Semana, na Livro 7, na UFPE e no Jornal Universitário onde ilustrava as matérias. Teve parceria nos jornais alternativos com Caesar Sobreira, Assis, Wilson Vieira entre outros e é o criador e o editor do hoje famoso e barulhento fazine CAOS e o criador da Sue, a garota livre, bela e sensual.

 

Ivan Maia é poeta, ator, compositor. É autor do livro "Corpoema: a vida como obra de arte" (2020) e "Azulírico" (2009), entre outros livretos. Teve poemas interpretados no teatro, tv e rádio. Organizou saraus de poesia em Recife, Salvador, Rio de Janeiro e Fortaleza. É professor da UFBA no Bacharelado Interdisciplinar em Artes e no Doutorado em Difusão do Conhecimento. Ensina também no Mestrado Interdisciplinar em Humanidades da UNILAB. Fez Pós Doutorado na Universidad de La Republica do Uruguay. É Mestre em Filosofia e Doutor em Educação. Natural do Recife, mora em Salvador.





ZIZO E IVAN MAIA – FRENTE A FRENTE





Mil Pronúncias

Zizo

 

Ela mira e mora onda

é musa Vênus,

Gioconda.

Estou nu em minúcias

sinto em seu olhar

mil pronúncias.

Cumpre-se nossa Astréia:

Cúmplice, é ela Medéia!

 

 

Pernambacante

Ivan Maia

 

A frevolução de um descabelado pernambucanibal

Junto à flor do asfalto de sua recificidade

É incendiária ousadia-a-dia que deixa vestígios

De um ser meio-vivo-meio-vida

 

Rock’n rouco alquimista em meio à fumaça

combustóxica do trânsito

 

Enquanto dormem os mendigos

Anda libertário, dionicínico e brasilivre por aí

 

Todos os brasilúdicos vibrasons da canção

Emanam a magia negra afro-íris de seu afeto

 

A dança das chamas no mar amar do desejo

Torna-se o reencanto da pura ilusão dos amantes

Uma transa em transe bacante

Pelas flechadas alucinógenas de Eros

Pulsações orgânicas dos corpos embolados

Pela alegria recriadora do vir a ser.

 

 

Delírio Supremo

Zizo

 

Quando sobre ti, sobra tal culto

onde a noite é obra, cio oculto

desvia-se o silêncio, vem o vento.

 

Quando sobre ti, sombra é vulto

vive o tempo, a arte, o insulto

desfia-se o segredo: nu invento.

 

Tuas mãos macias confiam desafio

de denúncias - fibras por um fio

aí, exprimes o macro desejo.

 

Nuas mãos vicias, confinas conflito

te delicias - febre delito

aí,  suprimes o sacro festejo.

 

 

Combustóxico

Ivan Maia

 

Saem de dentro, bem dentro da terra

extraídos pelo aço do braço viril

que arranca suga e esgota

seu uso e abuso de forças

 

Cadáveres da pré-história histérica

da vidanimal e outros vegetantes entes

decompostos ao seu dispor

 

Para que se possa navegar

pela desnecessidade

de tudo que se deixa para trás

com a poeira e os buracos da estrada

faminta de meninos pedintes

 

Veículos transitivos do verbo que se faz carne

elevando a matéria do fundo do poço

da condição inorgânica

ao céu da mais pesada e escura nuvem de fumaça

 

Só mesmo no interior isolado da nave

vagueamos vagalumes imunes ao efeito defeituoso

Do nosso consumo de energias não renováveis

 

 

Sobre a Arte

Zizo

 

A arte aspira ou conspira

diz da flor ou de mera ira

é a morte mais vivida.

 

A arte altera ou alterna

diz da alma ou a inferna

é a sorte mais contida.

 

A arte ostenta ou intenta

diz do vento ou inventa

sua porta à mentira.

 

Arte conversa ou converte

é diversa e diverte

se comporta, se pira.

 

 

Libertário

Ivan Maia

 

O poder

O poder opressor

O poder autoritário e mais nada!

As flores que eu quis cantar, não:

O poder arbitrário.

 

O que diz tudo, para que você não saiba

nem de si, nem da fome

O que some, depois de lhe deixar a pão e água

ou novela e voto, álcool e açúcar, medo e lei...

 

Este que sorri o tempo todo como uma caveira

tomada das mãos de Hamlet

para que não haja dúvidas

sobre tantas verdades-prédios, estátuas-discursos

e notícias de cidades desabando sobre mim

 

Sobre o que sou e sinto

quando não temo a morte

e descubro enfim um novo Norte

inventando flores, amores e poemas

pra dizer que sempre saberemos sonhar

com uma vida plena na Terra.

 

 

Te amo,

dos pequenos

aos grandes lábios.

 

Zizo





*Valmir Jordão é poeta, compositor, performer e colunista do site DCP





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